A obra da fotógrafa paraense foi o grande destaque da segunda noite de Festival

“Eu queria ser escritora, mas não tenho esse dom. Então escrevo com a imagem”. Assim disse Elza Lima, grande homenageada da noite de ontem no Festival de Fotografia de Tiradentes. O destaque do dia, no auditório do Centro Cultural Yves Alves, foi o lançamento do quinto volume da Coleção Ipsis, que compila trabalhos da fotógrafa paraense.

FOTO/VAN: João Vitor Bessa
FOTO/VAN: João Vitor Bessa

Durante esta semana, a turística Rua Direita de Tiradentes tem sido palco da sétima edição do Foto em Pauta, festival de fotografia que traz em sua programação lançamentos de fotolivros, exposições e palestras com diversos profissionais do ramo, vindos dos mais longínquos cantos do Brasil, trazendo consigo suas câmeras fotográficas e grande variedade de sotaques.

Assim como no Festival de Cinema, realizado normalmente em janeiro, a Rua Direita se enche de pessoas de origem bastante diferente dos moradores locais: pessoas em sua maioria brancas, muito bem vestidas e com aparente finesse. A atmosfera da cidade muda – e não necessariamente para melhor.

Todo o ambiente se adaptou para melhor receber os visitantes. Algumas ruas do centro histórico foram interditadas, o Largo das Forras foi cercado e alguns casarões, que hoje funcionam como centros culturais foram transformados em galerias de arte. É o caso do Sobrado Quatro Cantos, que durante o Festival recebe exposições e sedia lançamentos de fotolivros.

FOTO/VAN: João Vitor Bessa
FOTO/VAN: João Vitor Bessa

Esta sexta-feira, ao final da tarde, o jardim do pátio interno do Sobrado, um espaço bastante amplo e aconchegante, recebeu uma amostra de diversos lançamentos de fotógrafos contemporâneos. Entre eles, o destaque foi a revista Umbu.

“A Umbu foi uma aventura”, conta a  fotógrafa baiana Mariana David, 34, curadora e editora da revista. De acordo com ela, o objetivo do projeto é “Falar da Bahia no mundo; que valorize, investigue e coloque em contato o que vem sendo colhido nesses últimos anos no Estado”.

A Umbu reúne fotografias de dez fotógrafas e fotógrafos latinoamericanos, representantes de diferentes gerações e escolas, como Arlete Soares, Lázaro Roberto e Alexia Zuñiga. Como conta Mariana, a paridade de gênero entre os profissionais envolvidos no projeto foi uma exigência.

Logo se aproximava o início da palestra da noite e, mais uma vez, caminhei pela Rua Direita, em direção ao Centro Cultural Yves Alves. Um grande número de pessoas se aglomeravam à porta do casarão, esperando pelo momento em que poderiam assistir à palestra de Elza Lima.

Quando foram finalmente liberados, depois de formarem fila e esperar por um bom tempo, puderam subir as dezenas de degraus que os levariam ao hall do auditório. No hall, espaço pequeno, com piso de madeira e fachada abobadada, havia mais uma exposição de fotografias.

FOTO/VAN: João Vitor Bessa
FOTO/VAN: João Vitor Bessa

Com alguns minutos de atraso, o anfitrião da noite, Eugênio Sávio deu as boas-vindas aos espectadores, apresentando a mesa de debates formada pelo fotógrafo paraense Thiago Santana, o coordenador do Atliê Fotô Éder Chiodetto e Elza Lima. Antes que a grande homenageada da noite pudesse finalmente iniciar sua fala, seus dois companheiros de mesa tiveram seu momento para introduzir à plateia a obra e a vida de Elza.

Thiago falou a respeito da importância da geração de fotógrafos da qual Elza fez parte, destacando seu papel em documentar “um Brasil que saída dos escombros da Ditadura e passava a se redescobrir”. Éder, por sua vez, realizou a leitura do texto de introdução do livro da Coleção Ipsis, que compila a obra de Elza.

A primeira pergunta direciona a Elza dizia respeito ao ambiente em que foi criada, que contribuiu bastante para sua decisão de seguir a carreira como fotógrafa. De acordo com ela, as figuras de seus avós contribuíram para impulsionar sua imaginação, fazendo com que ela enxergasse de maneira diferente o mundo ao seu redor.

Duas viagens realizadas por Elza à Amazônia serviram como pano de fundo para a fala da fotógrafa a respeito das diferentes fases de sua carreira. Relembrando a primeira viagem, realizada em 1989, com o intuito de documentar o cotidiano de tribos indígenas da região, a fotógrafa destaca que um fator crucial para a realização do projeto foi estar “livre de amarras”.

Com essa liberdade, ela conta, foi possível entrar mais profundamente em contato com as populações locais, tecer relações de amizade enquanto ela esperava pelo momento ideal a ser registrado. “Eu preciso que esse tempo perpasse para que aconteçam as coisas que pressinto que vão acontecer. Na maioria das vezes acontece”, conta a sorridente e orgulhosa fotógrafa.

Por decisões editoriais, apenas os trabalhos da fase preto e branca de Elza foram inseridos no livro que, para a surpresa da plateia, foi o primeiro de sua carreira. Todas as imagens presentes na Coleção foram transmitidas, por um projetor gigantesco, na tela posicionada ao fundo do auditório. Algumas arrancaram suspiros dos espectadores; outras, gostosas gargalhadas.

A palestra durou uma hora e meia, tempo bastante escasso para falar da obra imponente da fotógrafa paraense. Ao terminar sua fala final, declarando amor ao estado de Minas Gerais, Elza foi efusivamente aplaudida. Com todos os méritos.

Terminado o grande evento da noite, o auditório rapidamente esvaziou-se. Algumas pessoas saíram com pressa, fugindo do frio. Outras, se aglomeraram no hall de entrada do auditório, como o rapaz que aproveitou um momento para tirar uma selfie e a moça de sotaque alemão que me abordou com um sorriso e pediu: “Tire um foto para mim, por favor”. E assim me despedi de Elza Lima, do Foto em Pauta e desta noite em Tiradentes.
FOTO/VAN: João Vitor Bessa

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