Nicolau significa “o que vence com o povo” ou, ainda, “o que conduz o povo à vitória”. Pesquisei há pouco, movida pela curiosidade. O nome foi dado à taça do campeonato de futebol amador de São João del-Rei, em 2016. Era uma homenagem a Nicolau Brighenti Cipriani. Este só fui descobrir quem era na final da competição.

Após a expulsão de um jogador, já no segundo tempo da decisão, a torcida invadiu o campo. Eu corri para longe do gramado. Lá no canto, longe da confusão e da torcida, havia um senhor sentado. Ele estava perto do banco de reservas, no qual, na verdade, mal cabiam os próprios reservas. Eu me aproximei como quem não quer nada, disse oi e perguntei o nome (mania de quem gosta de ouvir o que os outros têm para contar, costume que gosto de ter). “Nicolau”, ele respondeu.

Eu, que já estava conformada em não conhecer quem deu o nome à competição, ri surpresa. Então, perguntei, já com a certeza da confirmação: “Você é a taça?” Nicolau deu um sorriso sem questão alguma de esconder o orgulho que sentia pela homenagem.

Não precisei perguntar mais nada. Nos nove minutos que o jogo ficou parado, – até a polícia chegar e o árbitro optar por encerrar a partida e levá-la para os pênaltis – Nicolau me contou o que fez pelo esporte. E eu entendi o motivo da homenagem assim que notei o brilho que ele trazia nos olhos ao falar do futebol da cidade.

Como poucos, Nicolau viu o esporte de diferentes ângulos: no campo, na torcida, na imprensa, na arbitragem. E mais: fundou um time e criou o campeonato de Várzea da cidade. Coisa de quem ama tanto o futebol que precisa ultrapassar as quatro linhas.

“Nunca tinha visto homenagearem gente viva”, observa Nicolau. Eu concordo, não é comum. Por isso ele ficou surpreso ao ser convidado. Mas, convenhamos, não é qualquer nome: é um nome que já em seu significado sugere vitória.

E, no entanto, Nicolau quase não presenciou o campeonato. No dia do pontapé inicial, estava internado. Os médicos o liberaram apenas na véspera da final, como se por instinto soubessem que a competição não poderia terminar sem ser vista pelo homenageado. O futebol pode até ser injusto, muitas vezes, mas não a esse ponto.

A partida decisiva foi para os pênaltis. Então, direcionei-me para perto do gol com a certeza de que Nicolau tinha muito mais para contar. Ele, porém, ficou onde estava e, provavelmente, nem conseguiu enxergar as cobranças. Contudo, acredito que gols e defesas sejam meros detalhes para quem  vivenciou o futebol tão intensamente. Provavelmente, para ele, bastava estar ali, ouvir o povo torcendo e poder confirmar com os próprios olhos que a história do futebol são-joanense continua sendo escrita.

Ouvir Nicolau faz bem para quem ama o esporte. Faz-nos lembrar de que futebol é sentimento, acima de tudo – do primeiro suspiro até a lágrima que escapa. Futebol é intenso por natureza, nada abaixo disso. E é bonito perceber que é assim em qualquer lugar, seja nos estádios de Copa do Mundo ou nos campos no interior de Minas Gerais. É maravilhoso perceber que o futebol é capaz de encantar, mesmo quem já jogou, vibrou, narrou, apitou e fez tanta coisa pelo esporte.

Ver o Nicolau se emocionando ao entregar as medalhas para o time campeão do campeonato amador, em junho deste ano, foi incrível. Fez-me ter a certeza de que o futebol resiste no interior – do país e do coração.

Terça-feira passada, o esporte são-joanense ficou mais triste: Nicolau não estará mais aqui para acompanhar os campeonatos da região. A certeza, porém, permanece a mesma: há paixão pelo futebol em São João del-Rei. Obrigada, Nicolau!

 

TEXTO/VAN: Anna Virgínia*

Anna Virgínia foi repórter e estagiária da VAN UFSJ entre março e julho de 2016. Atualmente é aluna da Universidade Federal de Juíz de Fora, no curso de Comunicação Social – Jornalismo.

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