Ela desceu mais uma vez na mesma rodoviária em que desembarcara há um semestre. Já não tinha mais a sensação da primeira chegada. Se sentia em casa: “Que saudade desse lugar!”. Seus cabelos, agora mais curtos, representam liberdade. Na perna uma tatuagem, ressignificando uma mulher e seus sonhos, como se ressignificasse a si mesma. Em um pulso está escrito a palavra determinação, e no outro, perseverança.

Aquele mundo universitário não mais a assusta como no início. Ela se transformou. Vislumbrou novos horizontes, descobriu que o conhecimento liberta. E ficou com sede. Queria mais. Apenas um semestre fora de casa a encheu de força de vontade, de memórias e histórias pra contar. Novas amizades, novos sonhos para perseguir. Percebeu que não há nada de mais em gostar de meninas ou de meninos… Aliás, hoje entende que isso é da conta dela. …E só dela. Pela primeira vez se sentiu responsável por si. Ela agora se sente mais madura: planeja a volta às aulas no segundo semestre. Ainda relembra as palavras daquele professor pessimista, que no primeiro dia de aula a assustou: “O mercado de trabalho é cruel.  Não sonhe tanto!” . Afasta logo este pensamento recordando da professora sorridente que tanto gosta, que com um grande sorriso e olhos arregalados afirmava: “Transformem seus sonhos em realidade!”

Assim como sua professora, ela sorri sozinha ao pegar suas coisas no bagageiro do ônibus. Nas malas, comidinha de mãe e cachecol de vó para suportar o frio. “Vai com Deus, minha querida! Boa sorte! Fique firme!”. As palavras da velha e sábia senhora ecoam em seus ouvidos. Quase se permite uma lágrima, logo trocada por um sorriso ainda maior. Hoje, se sente acolhida em seu novo lar. Está com pessoas que desejam o mesmo futuro, sonham o mesmo sonho. Sabe que as diferenças existem, mas que devem ser respeitadas. Cada um é dono de si .

Volta às aulas! Volta ao mundo competitivo, porém acolhedor. Difícil, porém gratificante. Do professor pessimista ficou o aprendizado: a vida é dura mesmo. Mas da professora sorridente e de olhos arregalados, a mensagem de determinação e perseverança que hoje estampa em seus pulsos. Por mais difícil que seja, entende que deve seguir em frente. Ela anota essas palavras, pensando em uma nova tatuagem. Algo lhe chama a atenção. A rodoviária parecia inundada de uma energia gostosa: nostalgia. Em um canto, um garoto se despedindo de seus pais. Filho único. “Tem que estudar”, diziam os pais. No outro, um casal jovem com um bebê. Os dois com mochilas nas costas. Do outro lado da rua, um carreto transportando a mudança de um possível calouro. Resolveu se adiantar e praticar ali mesmo o fotojornalismo. Congelou os momentos mais sinceros assim que apertou o botão “capturar”. Não capturou somente aqueles momentos. Capturou seu coração. Percebeu que deveria se adiantar, a fotografia a fez vibrar.  Com uma mala na mão e a mochila no ombro, colocou o pé direito na calçada e seguiu para o próximo aprendizado.

Texto/VAN: Rafael Nascimento e Isadora Jales

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