Há 83 anos, no dia 3 de novembro de 1930, o então presidente Washington Luís instituía o direito feminino ao voto e, desde então, a data é comemorada como o Dia da Instituição do Direito ao Voto da Mulher.

Apesar de o voto feminino ter sido devidamente regulamentado somente durante o governo de Getúlio Vargas, os ideais sufragistas chegaram ao Brasil em 1919, trazidos da França e difundidos pela bióloga Bertha Lutz que, em parceria com a militante anarquista Maria Lacerda de Moura, fundou a Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher, que se tornou Federação pelo Progresso Feminino.

A professora Aline Martins, que ministra a disciplina Problemas de gênero: psicologia e teoria feminista, no curso de Psicologia da UFSJ, comenta sobre a importância da data.

Vertentes Agência de Notícias: O Movimento Sufragista no Brasil foi conquistado antes da maioria dos países latino-americanos – em parte, pela relação próxima que as sufragistas tinham com a elite política. Para você, qual foi o significado desse processo?

Aline Martins: O movimento sufragista ocorreu no Brasil de forma diferente dos países da Europa e dos Estados Unidos, sendo influenciado pela condição social e histórica de cada nação. A primeira onda do movimento feminista acontece no final do século XIX, quando as mulheres se únem, sobretudo na Inglaterra, para lutar pelos seus direitos, em especial o voto.  No Brasil, a primeira onda também é marcada pelo direito ao voto. A partir deste direito conseguido, foram atribuídas à mulher lugares permitidos e lugares proibidos. O lugar da política era o lugar mais proibido e, por consequência, o mais difícil de romper. A política reproduzia a própria hierarquia da sociedade brasileira que, por meio da sua história, legitimou a desigualdade. A militância feminista, assim como a militância de outros movimentos sociais, como negros e gays, mostra a inserção destes sujeitos no campo político, revelando um novo lugar a ser ocupado no espaço público da sociedade. O movimento feminista é um movimento comprometido com a reflexão crítica, com a construção de uma teoria que permita a leitura da sociedade a partir de novos olhares.

VAN: O sufrágio feminino no Brasil é um dos pilares da luta das mulheres pela luta por igualdade dos direitos e de tratamento. É possível afirmar que atualmente as mulheres possuem condições igualitárias as masculinas?

A.M: Sobretudo entre a década de 70 e 90, as feministas se interessavam em determinar a quem atribuir o peso explicativo da opressão contra as mulheres, embora existisse uma importância quase que unânime sobre os fundamentos das causas sociais. Com o advento da teoria feminista pós-moderna ou pós-estruturalista, a preocupação se baseia na busca da causa original e fundadora da opressão, levando em consideração outros aspectos que estão por detrás do fenômeno. A teoria feminista moderna propõe uma desconstrução da categoria de “mulheres”, defendendo que a noção de mulheres e homens se desenvolve a partir de construções históricas variadas que perdem coerência e estabilidade com o passar do tempo. É possível afirmar que a mulher, enquanto sujeito do feminismo, possui mais condições de questionar os mecanismos de reprodução e manutenção de poder presentes no mundo em que vivem e se posicionarem diante dessa realidade. 

VAN: Você vê alguma relação entre o direito de voto da mulher e o de ser votada com a participação da mulher no mercado de trabalho, em especial em postos de comando?

A.M: A maior participação da mulher no mercado do trabalho é um reflexo da saída da mulher do campo privado para o público. O movimento feminista possibilitou o direito ao voto, como outras conquistas. A mulher passa a circular em outros espaços, a assumir novas responsabilidades e papéis antes restritos. Podemos afirmar que as mulheres, em sua gama de variáveis, o que inclui questões econômicas, raciais, dentre outros, ainda não ocuparam todos os lugares possíveis.

VAN: Em que patamar a mulher brasileira estaria politicamente hoje comparando-se com outros países da América Latina e do mundo?

A.M: A mulher brasileira, assim como outras mulheres do mundo, a depender de todas as variáveis que compreendem o termo “mulheres”, possuem novas formas de circulação no universo público, a depender do contexto histórico, dos mecanismos de poder e legitimação que determinam quais espaços e papéis assumir. Hoje, as mulheres produzem uma política de presença, ou seja, a articulação feminista está para além da construção de ideias, ela se corporifica. Da mesma forma ocorre na América Latina e em outros países a depender da configuração de cada sociedade e da maneira que as lutas feministas de cada país ganham forma.

VAN/Ana Claudia Lima
Foto: Arquivo Pessoal

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