A revolução é ordem
Em setembro de 2011 um movimento popular iniciado em Manhattan espalhou-se por cidades de todo o mundo: era o Occupy Wall Street, que lutava contra a interferência de bancos e corporações multinacionais em processos democráticos nacionais. Em fins de 2015, foi a vez de estudantes da rede pública de ensino de São Paulo ocuparem escolas em protesto contra novas medidas no sistema educacional. Na segunda noite de debates da V Semana Acadêmica do Curso de Jornalismo da UFSJ, falamos de outros espaços, além dos físicos, que os movimentos e cidadãos ainda necessitam “ocupar”: a internet e a comunicação.
Daniel Perini, sociólogo e Superintendente de Monitoramento e Informação Digital da Secretaria Estadual de Direitos Humanos de MG, abordou aspectos do marco civil na internet, essenciais para garantir diversidade e pluralidade nos conteúdos difundidos pela rede (alguns pontos foram regulamentados em decreto no último dia 12/05, como a neutralidade da rede, saiba mais aqui). Para o sociólogo, a internet pode configurar um espaço de inclusão ou de exclusão. Por isso, em um vasto campo de busca e de acesso a conteúdos, é preciso compreender quem está por trás desses mecanismos, e garantir que estejam envolvidos com a democratização da informação, e não com leis de mercado.
Perini também divulgou iniciativas públicas como a rede Participa-MG, rede social em desenvolvimento, que vinculará pessoas a propostas relacionadas a suas realidades locais e deve estimular a produção de conteúdos novos e independentes. Divulgou, ainda, o curso Multiplicadores da Democracia que visa uma atitude colaborativa que reúna iniciativas de cunho cultural ou de criação de conteúdos, rádios e TVs comunitárias. Perini considera a necessidade de “massificar para ocupar a internet, assim como ocupamos espaços públicos”, e cunhou, como, palavra de ordem: “menos download e mais upload”, o que simbolizaria uma inclusão digital efetivamente mais participativa.
Da Universidade para a rua
A jornalista Rafaella Dotta, da primeira turma do curso de Jornalismo da UFSJ, também participou da mesa de debates, contando sobre sua experiência como repórter do jornal Brasil de Fato. Rafaella também abordou o Projeto de Lei da Mídia Democrática, nascido em 2009 com a realização da I Conferência Nacional da Comunicação, com participantes da sociedade civil, do poder público e setor empresarial. Por iniciativa do FNDC (Forum Nacional de Democratização da Mídia), a Campanha Para Expressar a Liberdade colhe, desde 2012, assinaturas para que esse projeto possa tramitar no Congresso (no link você pode ler o projeto na íntegra e realizar sua assinatura).
Sobre sua experiência no jornal Brasil de Fato, Rafaella explicou sobre métodos alternativos que o veículo usa na construção de suas pautas: os repórteres buscam dar às matérias um viés popular, ouvindo fontes mais diversas, e abordar temas que não estão em outros jornais. “Movimentos sociais têm pessoas que são capacitadas para falar sobre os assuntos, mas não são credibilizadas”, aponta Rafaela. Em geral, os repórteres buscam pessoas “autorizadas”, tradicionalmente, a falar sobre um tema. O Brasil de Fato preza pelas fontes alternativas, e por falar com o povo. Para Rafaella, ele busca “conseguir falar com a rua”.
Ela acredita que nisso está a dificuldade de muitas boas iniciativas de mídia alternativa: “Sair da universidade lendo intelectuais e passar a falar para uma pessoa que está pegando o metrô às 6 da manhã pra ir trabalhar”. E é onde está, para Rafaella, o diferencial do Brasil de Fato: “É um jornal popular de qualidade, que faz com que o leitor encontre nele algo que vai informá-lo sobre seus direitos, ou sobre questões políticas”. O que ela crê ser a tarefa do jornalismo, e uma tarefa desafiante. A repórter afirma que existe hoje uma crise de confiança nas instituições e grande descontentamento com a mídia e que atuar nesse cenário não será fácil: “É necessário disposição”.
Ocupar a praça
E se nós que estamos começando temos toda a disposição do mundo, também precisamos ouvir o conselho dos mais experientes. Nilmario Miranda, hoje Secretário de Direitos Humanos de Minas Gerais, foi o primeiro presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, em 1995. Ele conversou com os estudantes sobre a Comunicação do ponto de vista de direito fundamental, e não de mera mercadoria. “A Comunicação conduz a outros direitos”, ressaltou Nilmario.
Para ele, a comunicação seria hoje o que a praça simbolizava na Grécia Antiga: o livre espaço de diálogo. Mas, na configuração atual dos meios de comunicação, essa “praça” passou a não ser mais de livre acesso do cidadão – a maioria não tem o direito a comunicar. A concentração da mídia, a exclusão digital e o desconhecimento, pela população, das leis já existentes são alguns dos aspectos que Nilmario menciona como impedimentos a este livre acesso. Por isso, para ele, é necessária uma reforma da mídia que parta da iniciativa popular e que sirva à cidadania. E, mesmo com ventos não tão favoráveis, Nilmario acredita que isso ocorrerá. “Vai haver resistência. A sociedade vai perceber”.
À disposição de iniciantes, somamos então o otimismo dos mais sábios, que já conheceram outras reformas. Como Nilmario, que encerrou a mesa de debates com o conselho, “copiado” do Papa Francisco: “Sejam revolucionários”. Sejamos! A revolução, na Comunicação, não exige mais armas do que nossas ideias.
Texto: Dani da Gama