Pesquisa apresenta dificuldades da consolidação da imprensa em Minas
Da Inconfidência Mineira aos dias atuais, passando pela política do Café com Leite e por outros momentos marcantes da história do Brasil, Minas Gerais sempre foi presença forte no cenário nacional. Tal participação diz respeito aos campos econômico, político e cultural: na literatura, emergem iniciativas e sujeitos de vanguarda – entre os quais pontificam nomes como Carlos Drummond de Andrade e Guimarães Rosa. Esse celeiro propiciou uma safra de jornalistas-escritores que destilaram sua criatividade em jornais de Minas, até se projetarem, definitivamente, em outros centros nacionais e internacionais.
Desvendar por que, não obstante todas as condições favoráveis, dezenas de adeptos das letras e do jornalismo tiveram que sair de Minas Gerais em busca de melhores perspectivas profissionais: eis a empreitada a que se lançaram professores da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), ao desenvolver o projeto “Os impasses no processo de consolidação de uma Grande Imprensa em Minas Gerais”.
Sob coordenação de Guilherme Jorge de Rezende, professor aposentado do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFSJ, o trabalho contou com a atuação de três docentes do curso de Jornalismo da instituição: Jairo Faria Mendes, Luiz Ademir de Oliveira e Paulo Henrique Caetano. “O projeto concretizou trabalhos do grupo de pesquisa em Jornalismo e Estudos Culturais da Universidade”,conta o coordenador.
Panorama
Como universo da pesquisa, o grupo delimitou o campo do jornalismo impresso. Inicialmente, os estudiosos determinaram o conceito objetivo de “Grande Imprensa”, contribuição que se pretende para os estudos da área. De 31 jornais diários identificados pela pesquisa, de acordo com os critérios propostos, o Estado de Minas alinhou-se parcialmente à definição. O periódico deteve o monopólio do mercado do jornalismo impresso mineiro entre 1960 e 1990. Posteriormente, surge a concorrência do Hoje em Dia e O Tempo, além do fenômeno do jornalismo popular. “Os tablóides Super Notícia, campeão de tiragem no país, e Aqui resgatam o valor de uso do jornal por abordar fatos de interesse popular, numa comunicação direta, rápida e fácil”, comenta o professor.
As perspectivas para a imprensa oscilam entre previsões do fim do jornalismo impresso e o crescimento do formato popular. Essa última mostra reflexos em pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope), que aponta a Região Metropolitana de Belo Horizonte como aquela com maior média de leitura de jornais no país.
Enigma solucionado
Após ampla pesquisa documental, histórica e conceitual, além de entrevistas com profissionais do jornalismo mineiro, o grupo identificou três fatores passíveis de explicar por que a imprensa do estado demora a se consolidar: excessiva vinculação com o poder político, inexistência de condições para manter um jornalismo independente e concorrência com jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo. A primeira “categoria”, adverte o pesquisador, afeta, em maior ou menor grau, a imprensa nacional, sempre atrelada ao governo, em razão da excessiva necessidade de verbas publicitárias estatais. Em Minas, notavam-se, paralelamente, jornalistas e intelectuais que dependiam de emprego público. Durante muito tempo, na capital, profissionais da notícia acumulavam cargos em jornais e em órgãos de governo. “Nessas circunstâncias, era comum o profissional sair da repartição já com um release para publicar no veículo onde trabalhava”, conta.
O estudo também retoma o panorama nacional com o objetivo de compreender a inexistência de condições mercadológicas para a manutenção do jornalismo independente, já que a organização da imprensa, em sistema capitalista como o brasileiro, segue lógica essencialmente comercial. A economia mineira sustenta-se na indústria de base, intimamente relacionada a uma prática extrativista: a produção de minério. “Não dispomos de indústria de bens de consumo capaz de financiar a imprensa com investimento publicitário”, infere Guilherme.
A hegemonia das imprensas paulista e carioca se explica na penetração de jornais como Folha de S.Paulo e O Globo, oferecendo cobertura nacional mais detalhada. Esses veículos disputam, ainda, a verba publicitária com os jornais locais. A consequência é que, além da grande dificuldade de encontrar periódicos mineiros nas bancas de outras capitais, a imprensa local raramente consegue pautar o debate nacional, observam os pesquisadores. “Os veículos da grande imprensa já não possuem sucursais aqui, o que contribui com a redução das oportunidades de trabalho para os jornalistas no estado”, explica o coordenador.
No entanto, a estagnação frente à grande imprensa nacional decorreu, também, de condições que caracterizaram o jornalismo impresso mineiro. O monopólio exercido, ao longo de três décadas, pelo jornal Estado de Minas interferiu, decisivamente, no processo de formação da opinião pública – situação que se alterou apenas após a década de 1990, com o surgimento do Hoje em Dia, de O Tempo e dos tabloides populares.
Os resultados detalhados da pesquisa – que contou, também, com a colaboração de alunos de jornalismo da UFSJ –, além de serem apresentados em eventos nacionais de comunicação, resultaram em um vídeo e no livro Impasses e perspectivas da imprensa em Minas Gerais. Os pesquisadores planejam, como próxima etapa, estender os estudos às mesorregiões do estado. Afinal, destaca Guilherme Rezende, o conhecimento mais detalhado da realidade do jornalismo impresso do interior é imprescindível ao entendimento da complexidade da imprensa mineira.
Para ser Grande Imprensa
Como metodologia inovadora proposta pelo projeto, destaca-se a definição do conceito objetivo de Grande Imprensa, até então inexistente nas Teorias do Jornalismo. Para enquadrar-se nessa concepção, um jornal impresso precisa atender a oito critérios: 1) Periodicidade diária 2) Vínculo com o Índice Verificador de Circulação (IVC) 3) Editorias bem consolidadas 4) Estrutura noticiosa de cobertura em âmbito nacional 5) Poder de agendamento 6) Anunciantes de abrangência nacional 7) Circulação nacional 8) Posicionamento empresarial
PROJETO: Os impasses no processo de consolidação de uma Grande Imprensa em Minas Gerais COORDENADOR: Guilherme Jorge de Rezende
MODALIDADE: Grupos Emergentes de Pesquisa
VALOR: R$ 61.380,40
Matéria publicada na Revista Minas Faz Ciência – Por Virgínia Fonseca
Publicada em 11/10/2013 Fonte: ASCOM