Escrito por: Christopher Gonçalves Faria

Revisado por: Samantha Souza

– Tá assistindo esse jogo porquê, moço?

– Uai, é copa do mundo.

– Mas Brasil saiu.

– Mas é futebol. É Copa do Mundo.

– E vai torcer pra argentino?
– Isso nunca! Por mim ganhava Marrocos. Sabia que é a primeira vez na história da Copa que uma seleção africana chega na semifinal? Seria incrível se ela tivesse passado. Torceria pra eles, mas agora…

– Vai torcer pra francês?

– Ah, vou só assistir o jogo, sem torcer.

– Tem como isso?

– Também achava que não tinha, mas tem.

– Eu não consigo. Gosto de sentir que faço parte de um grupo grande torcendo pra alguma coisa. Assim, jogo sem Brasil, acho sem graça. Pra te ser sincero, eu nem gosto muito de futebol, então nem tô com esse jogo.

– Uai, como assim não gosta? Do jeito que tava falando pareceu que era apaixonado.

– Nah, Copa do Mundo que faz isso comigo. É emoção demais torcer para o Brasil.

– Foi emocionante mesmo. Não vou mentir, quando o Brasil saiu eu até chorei um pouco. Depois de tanto sofrimento que a gente brasileiro vem enfrentando, um hexa faria muito bem pro país.

– Ô se faria! Ser brasileiro nunca foi fácil, mas nesses últimos anos parece que foi mais difícil que nunca.

– GOL? Ah, impedido.

– Uai, achei que não tava torcendo pra ninguém.

– E não tô, mas gol é bom ver, né.

– É… quando é do Brasil.

– Mas Brasil saiu, meu jovem. Temos que aceitar.

– Será que a gente vai ter que esperar realmente mais quatro anos pra ver quase o país todo junto com um sentimento?

– Como assim?

– Ah, sei lá. Senti que o Brasil vem se dividindo muito. Isso de “polarização” que os jornais não param de falar. Quando começou a copa, eu andava pelas ruas vendo quase todo mundo de verde e amarelo, cores do país, não de uma pessoa, as ruas lotadas, todo mundo com a mesma expectativa do hexa. Foi gostoso ver todo mundo, pelo menos muita gente, unida num sentimento.

– Foi a primeira copa que você acompanhou, jovem?
– Foi. A última eu vi, mas não acompanhei.

– Ah, eu te entendo. E pode ter certeza, de quatro em quatro anos, parece que não existe desavença nenhuma entre brasileiros. É sempre essa emoção mesmo.

– O senhor já viu muita copa?

– Acompanhei toda a carreira do Pelé, meu filho.

– Acha que o Brasil tem realmente chance de um hexa no futuro? Vi uns outros jogos nas outras fases e os outros times pareciam fortes demais!

– Ah, mas os outros países não são o país do futebol, né! A próxima é nossa.

– Eu ouvi isso quatro anos atrás…

– E vou falar isso daqui quatro anos também.

– Uai, não tava confiante que a gente ia ganhar a próxima?
– Eu tô, uai! Na próxima eu vou tá falando do hepta!

– Queria essa confiança que o senhor tem!

– Né confiança não! É esperança mesmo. Quero viver pelo menos pra ver o hexa. Mas você vai ver até a gente conseguir 10 copas, vai ver!

– Não sei se vou viver isso tudo.

– Eu certamente não vou.

– Vamo para de assunto ruim! O senhor vai ver as 10 vitórias sim.

– GOL! Agora foi.

– Vou ter que ir embora, mas quando eu chegar em casa prometo ver esse jogo, se a gente se ver por aqui de novo a gente comenta.

– Até, meu jovem.

            Só quando saio que noto que o bar e as ruas próximas estão lotadas. Todos – de várias idades e jeitos e gerações – vidrados na televisão. Talvez (como o senhor que acabei de conversar) todos sem torcer para nenhum dos dois times. Talvez alguns torcendo para a Argentina, outros para a França, por afinidade, loucura ou só pra ter alguém para torcer.

            Chego em casa ainda com a visão do bar e rua cheios gravada em minha memória. O Brasil saiu, mas todos estavam lá reunidos, mesmo que sem um sentimento único.

            Ligo a TV e começo a apreciar o jogo. Como todos, ou como alguns (ou talvez só como o senhor do bar), assisto sem torcer para nenhum dos dois e… me sinto bem.