Nascido em 29 de março de 1988, na cidade de São João del Rei, Fábio Ernesto Lima de Campo foi criado no bairro da Colônia. Lá, influenciado por seu pai, surgiram duas grandes paixões: o futebol e o Nacional, time do bairro. Desde bem novo, o garoto “Ney”, como ainda é conhecido na vizinhança, mostrava nos campos que era diferenciado por sua velocidade e habilidade. Quis o destino que Nem levasse ao mundo o nome de seu estado natal: fora daqui, tornou-se Fábio Mineiro. 

Hoje, após ter jogado por diversos times do Brasil, disputado uma Libertadores pelo Jorge Wilsterman, da Bolívia, e rodado pela Europa, Fábio acaba de assinar contrato com o AIK, da segunda divisão grega. No decorrer de mais de duas horas de conversa, Fábio nos mostrou seus troféus e seu principal tesouro: a camisa do Jorge Wilsterman com a qual marcou um gol contra o Emelec, pela Taça Libertadores da América. Nesta entrevista conversamos sobre sua carreira, suas origens, problemas nas categorias de base em São João del Rei, seu atual momento e, claro, muito futebol.

Vertentes Agência de Notícias: Fábio Mineiro, nós sabemos que, até chegar ao profissional, o garoto da base passa pôr várias etapas (pré-mirim, mirim, infantil, juvenil…). Você jogou aqui em São João no Carandaí. Quais foram as maiores dificuldades nessa época?

Fábio Mineiro: Foi meu começo aqui no Carandaí, juntamente com o Nenem (Treinador de infância) que é um cara que está sempre correndo atrás, aqui em São João, dos objetivos das crianças, dos atletas…tem aquela dificuldade da base aqui em São João, o futebol não tem aquele apoio em questão de categorias de base, ainda está um pouco ultrapassado o pensamento do pessoal sobre o amadorismo… Acho que, nessa época, a gente passa um pouco de dificuldade, mas no momento era o que eu tinha para buscar meu sonho. Tive essa oportunidade de jogar na escolinha do Neném, um momento em que tive uma boa base com ele. Não completa, igual a um clube grande, mas era o que ele tinha para passar, era essa condição.

VAN: Fábio, sabemos que São João é um celeiro de jogadores. Daqui saíram Gallardo (Cabofriense), André Luís (Palmeiras), entre outros. Qual a importância da base no lado profissional e social do jogador são joanense?

F.M.: Essa questão da base é de suma importância, porque é de onde vêm os primeiros passos do jovem, e a pessoa que sonha em ser profissional tem que ter uma base. Às vezes pecamos muito aqui em São João. Tem muitos jovens talentos que saem de São João com uma idade ultrapassada, chegam a uma equipe de alto nível, não assinam um contrato porque pecam um pouco nessa parte da base, na parte de fundamentos…são detalhes que interferem no sucesso de um jovem e, como aqui em São João temos vários bons jogadores, estamos pecando nessa base de ter um crescimento desses jovens. Eu espero que daqui para frente, com pessoas como vocês, que estão fazendo esse trabalho aqui em São João del Rei, as coisas melhorem. Esperamos que pessoas que gostam de futebol possam dar essa base paras as crianças, tirando elas das ruas, porque pode ter um futuro talento aí para São João… e com um pouco mais de apoio nessa questão de base, poderíamos ter muito mais atletas.

VAN: Falando um pouco agora do Fábio Mineiro profissional, você saiu de São João novo. Como foi sua descoberta no meio do futebol? Foi através das famosas peneiras, foi olheiro, empresário?

F.M.: Foi através de olheiros e contatos, algumas pessoas envolvidas no meio do futebol que me levaram para fora. Uma coisa que eu guardo muito bem, foi o apoio do meu tio quando eu me mudei para Divinópolis. Às vezes não tinha muito aquela ajuda de custo do clube, tinha que ficar pegando quatro ônibus por dia para poder treinar e voltar. Mas eu me comprometi a passar por isso, porque eu tinha um sonho a realizar. Graças a Deus, depois eu tirei tudo de melhor e cheguei ao profissional e disputei competições que qualquer um gostaria de disputar.


VAN: Você jogou na Polônia, Bolívia e agora está na Grécia. Desses países, em qual você encontrou maiores problemas de adaptação? Tem algum fato curioso ou engraçado que você pode contar para a gente?

F.M.: Quando eu estava em São Paulo, nunca tinha viajado para fora do país. Fui para a Polônia. Dificuldade você encontra, cultura diferente, comida diferente. Mas eu sempre fui uma cara que estava ciente do que queria, e não era pouca dificuldade que iria fazer eu desistir do meu sonho. Tinha saudade da família, mas eu passei por cima de tudo isso aí. Um critério que pesou muito na Polônia foi o clima: chegou a fazer -20ºC.
Lembro de uma história engraçada com um amigo nosso, do Nordeste, que tem o apelido de Romário. Estávamos indo para pegar um voo e, na hora de passar pela alfândega, o raio x não parava de apitar. A gente ficou se perguntando: “o que é que essa cara tem? será que ‘tá armado?”. Nisso a polícia pediu para ele abrir a mala e, quando vimos, tinha uma colher enfiada dentro de uma lata de doce de leite (risos).

VAN: Na libertadores de 2011, quando atuava pelo Jorge Wilstermann (Bolívia), vocês caíram em um grupo que contava com Jaguares (MEX), Emelec (EQU) e Internacional (BRA), você jogou no Beira Rio (Estádio de Copa do Mundo). Qual foi a sensação de jogar para um público de 50 mil pessoas?

F.M.: Foi um sensação única. Todo jogador sonha em jogar em um estádio como o Beira Rio, contra uma equipe que era campeã mundial com vários jogadores como D´Alessandro, Oscar, Kleber, Damião… Para mim, foi uma experiência muito boa, pude tirar muitas coisas boas desta partida. Jogamos também no próprio Jorge Wilstermann com 30 mil pessoas, e eu guardo boas recordações.


VAN: Nesse jogo contra o Internacional no Beira Rio, você teve algum caso inusitado dentro do jogo que você possa contar, alguma conversa com algum jogador?

F.M.: No intervalo do jogo, o Oscar (Seleção brasileira e atual jogador do Chelsea) chegou e me deu um toque na época que o treinador Abel Braga mandou redobrar atenção sobre mim, porque eu era o que estava mais criando dificuldade para a zaga do Inter até o momento.

VAN: Fale um pouco do seu time nesse momento, da estrutura e tempo de contrato…

F.M.: Bom, eu estava na Cabofriense e apareceu uma proposta da Grécia, que aceitei e, no dia 3 de setembro, cheguei ao meu atual clube. Mas aconteceu um problema na transferência, porque a janela europeia de transferências fechava dia 2 de setembro, então tentaram me inscrever nessa data, mas não conseguiram e fizeram uma solicitação na FIFA.Todo esse esforço era para eu jogar o primeiro turno do campeonato. Como não houve êxito na apelação, só poderia ser inscrito quando a janela de transferências reabrisse, no dia 2 de janeiro. Com isso ganhei um tempo aqui em São João del – Rei, onde posso ficar um tempo com minha família e amigos. Mas depois dessa pequena folga, volto para a Grécia, onde começo os treinos com meus companheiros e espero ainda ajudar meu clube na disputa do primeiro turno, que tem seu término no dia 26 de janeiro.

VAN: Muitos jogadores brasileiros que vão para a Europa sofrem com o racismo. Temos um grande exemplo, que é o caso do volante da seleção brasileira de futebol e do Tottenham (Inglaterra) Paulinho, que assim como você, jogou na Polônia e quase abandonou o futebol por esse motivo. Você teve algum incidente nesse aspecto na sua carreira no exterior?

F.M.: Sim, tive um incidente na minha chegada à Polônia em 2009, quando eu e meu amigo Edson, por sermos brasileiros, sofríamos com os olhares estranhos da população da cidade onde jogamos juntos. Mas não tive maiores problemas, sempre fui bem respeitado por onde passei, tirando essa ocasião.

VAN: Fábio, vida de jogador às vezes é meio ingrata. Vários são os exemplos de jogadores que tiveram a chance de se dar bem na vida através do futebol, mas acabaram desperdiçando por fatores extra campo. Você já pensou em abandonar a carreira de jogador de futebol?

F.M.: Sim, já estive pensando em parar, porque, como hoje sou um pai de família, às vezes você encontra alguns clubes que pecam na questão salarial, então isso me deixa chateado, pois sou um trabalhador igual a todos. Se você trabalha, quando chega o fim do mês você quer receber seu salário, pois você tem contas a pagar, família para sustentar, filho para criar… Já passei por essa situação de atraso de salário, mas tive o apoio de pessoas muito importantes na minha vida, que me ajudaram nos altos e baixos que essa carreira nos propõe. Agradeço a Deus por ter me ajudado também nos momentos difíceis e a toda a minha família, que me apoia sempre. E espero agora, com 25 anos, poder “estourar” na minha carreira. Às vezes encontro pessoas que dizem que já estou velho para acontecer isso, mas não acredito nisso, pois existem vários casos de jogadores profissionais que obtêm o sucesso meio tarde. Temos o exemplo do Diego Costa, que foi renegado por vários clubes aqui no Brasil e hoje se encontra na Espanha, jogando no Atlético de Madrid. No futebol, basta estar bem fisicamente, porque quando a oportunidade aparece, você tem que estar bem para poder agarrar e dar sequência na carreira.

VAN: Você pretende voltar ao Futebol brasileiro em um curto espaço de tempo? Você teria alguma preferência por algum clube?

F.M.: Isso depende muito da parte financeira, pois também existe a proposta da Grécia, onde já me pagaram uma parte e espero poder receber o resto, pois essa parte financeira é muito important,e e se houver algum atraso isso pode alterar a sequência do trabalho. Mas se houver alguma proposta boa daqui do Brasil, não vejo problema em voltar.

VAN: Fabio você jogou aqui no Brasil e rodou o mundo. Devido a essa violência no futebol brasileiro, onde você se sente mais seguro? Aqui no Brasil ou no exterior?

F.M.: Essa parte de segurança não é um problema só do Brasil, mas ocorre em vários lugares do mundo. São poucos os países em que não existe esse problema. Hoje aqui no país existe um problema muito grande de segurança nos estádios, onde famílias não podem mais ir sem se preocupar com a violência. Mas esperamos que sejam tomadas providências, que não venham a punir somente as equipes, mas sim essas pessoas que se dizem torcedores, pois quem tem que frequentar os estádios são os verdadeiros torcedores. Esperamos mais segurança nessa área esportiva e a separação dos verdadeiros torcedores.

VAN: Na infância, todo menino se espelha em alguém. Em quem você se espelhou no futebol?

F.M.: Sempre me espelhei no Ronaldo fenômeno. De muitos, é o que acho melhor de todos, com uma habilidade fora do comum, uma explosão e uma finalização… Gosto muito do Ronaldinho Gaúcho também, mas o cara que me inspira é o Ronaldo.


VAN: Fábio, você é um exemplo aqui em São João del – Rei, um cara que venceu na vida, jogou a Libertadores, em vários estádios conhecidos mundialmente. Qual é a mensagem que você deixa para essa garotada que está começando agora?

F.M.: O recado que eu posso deixar é que a criança que tem aquele sonho, não desista, vá até o final. Eu não desisti, passei por muitas dificuldades na categoria de base, mas nunca desisti. Enfrentei, fui até o final e pude jogar várias competições, como a Libertadores, que é o sonho de todo atleta jogar. E jogar fora do país, tive essa oportunidade e espero que todos esses meninos que têm esse sonho se dediquem, façam o máximo e que tenham perseverança para que um dia esse sonho possa ser realizado. Basta acreditar.

VAN/Diego Cabral/ Rafael Silveira/ Cristiano Giovanni
Foto: Arquivo pessoal

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