O corpo se movimenta com leveza, o contato físico não sugere
agressão, a roupa branca remete à paz, a música traz um tom de
alegria ao ambiente e a firmeza e dificuldade de cada golpe fascinam
os olhos de quem acompanha de perto uma roda de capoeira do Grupo
Tradição, da cidade de Lavras (MG).
O responsável por ensinar e manter vivo esse gingado que, mais do
que um esporte, é parte da rica história de nosso país, é Evandro
Miranda, professor de Educação Física, pós-graduando em
atividades desportivas, mas que prefere ser chamado de Mestre Grilo.
            A capoeira, desde 2008, é reconhecida por lei como patrimônio
cultural brasileiro e vem se organizando para se tornar também
esporte competitivo. No Brasil, já existem alguns campeonatos
nacionais, porém, em Minas Gerais, a Federação (órgão que filia
as equipes e promove campeonatos) está desativada, fazendo com que
as competições não sejam consideradas competições mineiras mas
sim, regionais. “Hoje o campeonato é o foco do capoeirista
também. Por mais que se tenha aquele lado ‘cultura’, aquele lado
folclórico, a capoeira também é competição”,
afirma Mestre
Grilo.
No quesito competição, mestre Grilo e seu grupo não decepcionam.
Disputando campeonatos desde 2009, o grupo de capoeira Tradição
alcançou a marca de 15 troféus em 15 campeonatos disputados, foi
oito vezes campeão regional e é a única equipe de Minas Gerais a
conquistar um título nacional pelo esporte, obtido em 2012, na
cidade de Passos (MG).
Com o desejo de criar na região de Lavras uma cultura deste esporte
que é tão representativo para nação, criou-se nas cidades
mineiras de Nepomuceno e Ijaci núcleos que trabalham com crianças
de periferia, cujo objetivo é difundir a capoeira como esporte,
cultura, mas principalmente, como uma forma alternativa de educação.
Nathan, capoeirista e aluno de mestre Grilo, conta os valores que
aprendeu com a capoeira. “Proporcionar, buscar e superar estes
aspectos estão intimamente ligados à modalidade
[capoeira],
além de ser uma forma de recontar a história do nosso povo”,
diz
o aluno.
Para o mestre Grilo, a competição é apenas um viés da capoeira.
Engajado em projetos sociais, ele se orgulha ao falar da
responsabilidade social que envolve o esporte. “O grupo de
capoeira Tradição foi registrado em 10 de dezembro de 2003. Quando
eu registrei o grupo, comecei a abrir os olhos e a ver que a capoeira
tinha um potencial de educação muito grande. Comecei um trabalho em
2001, antes de registrar o grupo. Eu dava aula na Comunidade das Três
Barras, na Escola da Lagoinha
[Zona Rural de Lavras],
terminava a aula de capoeira de duas horas com uma mensagem
religiosa, com um momento de relaxamento ou com uma reunião
ensinando o que a gente pode ser com pai e mãe, na família, falando
como eles podem, através do estudo, mudar suas vidas e, assim
comecei a perceber que uma simples aula de capoeira tocava tão fundo
no menino, que me apaixonei completamente e resolvi me formar em
educação física, porque o diploma me ajudaria a profissionalizar e
organizar a capoeira na região”
comenta emocionado, o mestre.
 
Ritos e aparatos da capoeira
 
Pandeiro e berimbau, utensílios rítmicos da capoeira
Os grupos mais organizados que estão mais ligados a competições
modernas qualificam seus atletas com cordões seguindo as cores da
bandeira do Brasil. Os estágios das cores são: primeiro estágio:
verde, segundo: amarelo, terceiro: azul, quarto: verde e amarelo,
quinto: verde e azul, sexto: amarelo e azul, sétimo: verde amarelo e
azul. Neste, o aluno é formado. Monitor: verde e branco, professor:
amarelo e branco, contramestre: azul e branco, Mestre: branco. A
corda branca é destinada a mestres acima de 33 anos de idade, então
o azul e branco passa a ser de mestre primeiro grau e o amarelo e
branco, passa a ser um contramestre.
Mas não são apenas os cordões que lembram a cultura brasileira. As
cantigas cantadas nas rodas são originárias do samba, que se tornou
marca da música popular brasileira. Estas cantigas têm, sobretudo,
a intenção de educar, apontando como deve ser o comportamento do
capoeirista, o discurso moral e a filosofia da própria capoeira. Os
mestres e contramestres transmitem os fundamentos da capoeira, muitas
vezes através das cantigas. Geralmente é através da improvisação
do texto num contexto específico que o Mestre explica, mostrando e
cantando, o fundamento da Capoeira, para o aprendiz que está jogando
ou observando.
Estas canções são sempre acompanhadas de instrumentos de
percussão, seja pandeiro, atabaque ou agogô, e de um berimbau. Na
capoeira, independentemente de grupos mais conservadores ou
contemporâneos, e até mesmo em competições oficiais, o berimbau é
tocado pelo mestre maior, que dita o ritmo e o estilo que a luta
acontecerá. Isto é a parte cultural que nenhum capoeirista abre
mão: proceder de acordo com que o berimbau mandar. O pandeiro e o
atabaque acompanham o ritmo, mas é o berimbau que dará o tom para
que o capoeira gingue e extravase em seus movimentos toda a tradição
de um esporte que jamais deixará de ser um símbolo nacional.

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