Não há nada há temer… Temer o quê?
Quincas já um pouco bêbado está na sacada do velho sobrado a contemplar a Igreja do Carmo. Da rua da cachaça vê Dionísio se aproximar com um radinho a tocar alguma música de Chico Buarque.
__Tens visto as notícias no Jornal Quincas?
__Jornal? Só uso pra embrulhar peixe. E a TV que eu tinha de herança de meu avô “pifou” no último mês.
__Quem és tu Quincas? Alheio ao mundo ao seu redor. Só vive a embriagar-se e a declamar versos.
__”Mundo mundo vasto mundo. Mais vasto é meu coração. Quem sou eu?
__Pare já com asneiras e venha ficar conosco.
__Estou perdido na vastidão do mundo.
__ Tu bebes. Tu cantas. Tu danças. Tu grita.
__Às vezes sinto que uma parte de mim é multidão, enquanto outra parte é estranheza e solidão. Uma parte de mim é permanente, outra parte se sabe de repente. Uma parte de mim é todo mundo, outra parte é ninguém, fundo sem fundo. E agora José?
__ E agora Quincas?
__Perdi a rima em meio ao mundo das palavras. E continuo a embriagar-me com esse maldito conhaque. Mas a lua..Ah a lua continua linda.
__Quincas meu amigo, tu tentas em vão esquecer que o país está um caos.
__Meu mundo é um caos.
__Pensas vagamente que não há nada há temer…
__Temer…
Texto: Thais Andressa
Revisão: Julia Benatti
Imagem: Thais Andressa