Por Geovana Nunes e Maria Beatriz Garcia

Revisado por: Samantha Souza

Fachada da AGC Águas Santas e César de Pina. Foto: Geovana Nunes

Todo dia ele faz tudo sempre igual. Vai até a agência dos Correios, às 7h da manhã. Pega as correspondências com um sorriso sempre igual e espera que estas encontrem seus destinatários.

Essa é parte da rotina de Ricardo Augusto Gonçalves de Castro (56), auxiliar administrativo da Prefeitura de Tiradentes. Sua carga horária de trabalho é divida entre a entrega de objetos postais na Agência Comunitária dos Correios (AGC) de Águas Santas e César de Pina e a prestação de serviços no Posto de Saúde de Águas Santas.

As AGCs são locais de retirada postal, criados a partir de uma parceria entre os Correios e os municípios, para atender as zonas rurais. No caso da AGC das Águas Santas, a parceria foi feita entre os Correios e a prefeitura de Tiradentes, com apoio da associação local de moradores. 

As correspondências são enviadas diariamente de Tiradentes para a AGC, localizada na Sociedade Amigos de Águas Santas, onde devem ser retiradas pelos próprios destinatários, em um prazo de sete dias, entre 7h e 11h, horário que, de acordo com Ricardo Castro, foi solicitado pelos próprios moradores da região. 

Placa de fundação e aviso de ausência de entrega domiciliária feita pelos próprios Correios na AGC Águas Santas e César de Pina. Fotos: Geovana Nunes

Na unidade dos Correios de Águas Santas e César de Pina, a entrega em domicílio dos objetos postais não é realizada. De acordo com Mirian Matias (59), que reside no bairro há cerca de dois anos, Ricardo, por vezes, avisa os moradores sobre a chegada de encomendas e, quando esses não conseguem buscá-las, leva as correspondências até eles. Ainda que isso não seja sua responsabilidade.

Adalgisa Maria da Silva (61), moradora das Águas Santas há mais de 30 anos, afirma que Ricardo Castro faz esse trabalho para que as encomendas não retornem ao centro da cidade. Pois, uma vez devolvidos, produtos ou cartas devem ser retirados diretamente na agência localizada na sede de Tiradentes. 

-“Quando alguma correspondência fica muito tempo parada, ele faz a gentileza de ir na casa das pessoas e entregar”, afirma Mirian. Adalgisa reitera que, mesmo que não seja obrigação de Ricardo, ele sempre coloca bilhetes e informes nas caixas de correio dos moradores, para auxiliá-los.

Caixa de correio. Foto: Geovana Nunes

Ricardo afirma que, às sextas-feiras, entre as funções e tarefas desempenhadas no Posto de Saúde, entrega correspondências em César de Pina, que fica a cerca de seis quilômetros de Águas Santas. – “Ele leva os pedidos e exames da gente em Tiradentes também”, afirma Mirian sobre as funções no Posto. – “Não tem nem tempo […] é muita correira”, ressalta Adalgisa. De acordo com Mirian, mesmo durante as férias de Ricardo, ele é quem encontra pessoas para substituí-lo e manter a prestação de serviços. 

Ele ressalta também que o trabalho é marcado por algumas dificuldades. – “Há uma reclamação muito grande, porque faturas de cartão de crédito ou de telefonia, por exemplo, chegam aqui com atraso. Elas já chegam em Tiradentes atrasadas. Eu confiro tudo para garantir que não há nada vencido, mas acontece. Eu, às vezes, fico chateado. Já aconteceu de a pessoa rasgar a correspondência na minha frente.”

Correspondências organizadas na AGC de acordo com ruas e travessas de Águas Santas. Foto: Geovana Nunes

Mirian se mudou de Belo Horizonte para Tiradentes e diz que existe um choque de realidade entre centros urbanos e uma zona rural, mas afirmou que os moradores do bairro já estão habituados com a logística das coisas. 

– “Normalmente as pessoas do bairro e os moradores sabem, né? Às vezes, uma pessoa nova que chega não tem essa informação”, afirma. 

Ela reforça, ainda, que a situação das ruas do bairro é extremamente precária – há buracos, ruas de terra e de pedras irregulares. De acordo com Ricardo, isso dificulta, inclusive, a entrega das correspondências. – “Há alguns anos, houve um estudo para que o próprio Correios fizesse as entregas, por meio do serviço de um carteiro. O pessoal veio, fez um levantamento, andou, viu as ruas, e achou que não era viável. Na época, o bairro era pequeno. Hoje, Águas Santas cresceu muito” 

Encontro das ruas São José e Padre Raposo – Águas Santas, Tiradentes. Foto: Geovana Nunes

-“Eu moro em Águas Santas há 35 anos. Nesse tempo todo, poucas melhorias foram feitas. Isso, porque as próprias verbas encaminhadas à Prefeitura são direcionadas a questões específicas. A verba pública de uma escola não pode ser colocada num asfalto. Cada prefeito tem as suas prioridades. […] Águas Santas cresceu, mas a infraestrutura do bairro não consegue acompanhar esse crescimento. Isso acontece tanto aqui quanto em César de Pina, Caixa d’Água e Elvas. A sede já é mais bem estruturada. É difícil trazer as coisas de Tiradentes para cá. Muitas vezes, é você por você”, ressalta Ricardo. Assim como Águas Santas e César de Pina, os bairros Elvas e Caixa d’Água da Esperança pertencem à área rural de Tiradentes. Os Correios costumam se associar com a prefeitura para atender as zonas rurais de difícil acesso. 

Diante de ruas precárias e dificuldades em designar funcionários públicos para atender às demandas do bairro, vale destacar a atuação da associação de moradores e da comunidade de Águas Santas. “Hoje, para manter uma associação, a gente não tem subsídio nenhum. Não tem dinheiro. Não tem nada. A pandemia, ainda por cima, espantou o pessoal”, afirma Ricardo. Ainda assim, os moradores das Águas Santas se mobilizam para contornar os problemas com os próprios recursos, depositando cimento ou brita nas ruas, por exemplo.