Lei Aldir Blanc: Apoio e resistência para o setor cultural
Por Ana Cláudia Almeida e Giulianna Andrade
A Lei Aldir Blanc (LAB), ou Lei Federal nº 14.017/2020, foi um marco na política pública do Brasil ao estabelecer medidas emergenciais para o setor cultural e criativo durante a pandemia de COVID-19. A partir da LAB foi criada, em 2022, a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), que, atualmente, configura a maior política cultural da história do país.
A PNAB, regulamentada pelo decreto nº 11.740/2023, garante uma fonte estável de verba para o setor artístico-cultural até 2027. Nesse período de cinco anos, os investimentos serão anuais e totalizarão R$15 bilhões, segundo o Governo Federal. A medida, fazendo jus ao nome, busca principalmente desenvolver o acesso à cultura em todos os estados, municípios e Distrito Federal. Nesse sentido, os entes federativos têm poder de implementação de ações públicas através de editais e chamamentos abertos aos diversos trabalhadores da área. Em suma, para participar dessas seleções é necessário ser pessoa física com mais de 18 anos ou empresa/MEI (microempreendedor individual) do setor cultural.
A Lei Aldir Blanc, além de viabilizar os repasses de recursos para artistas, coletivos, empresas e espaços culturais prejudicados pela paralisação das atividades, promove a preservação da cultura local. Nesse viés, sua operação honra o legado do ilustre compositor que originou sua nomenclatura. Aldir Blanc, uma figura simbólica da cultura nacional, faleceu em 2020, aos 73 anos, em decorrência do vírus da COVID-19.
Para muitos, a LAB não apenas trouxe alívio econômico em meio ao caos pandêmico, como também reforçou, e ainda reforça, o papel da cultura como um pilar de identidade e resistência social no país. Segundo relato de Juliano Pereira, 53, coordenador geral e diretor artístico do Teatro da Pedra de São João del-Rei, a inesperada crise sanitária afetou diretamente todo o planejamento realizado com antecedência pela companhia, gerando “cortes financeiros,(…) mudanças, muitas dificuldades”. No entanto, em paralelo, da adversidade surgiu “uma ideia bem interessante, bem importante”. Para o também ator e educador, cuja infância marcada por idas ao teatro, ateliês de artistas e espetáculos induziram seu gosto e escolha pelo palco, “a arte nos faz ver o mundo de uma maneira plural. (…) Então,(…) são diversos os efeitos, a presença da arte nas sociedades traz (…) diversos benefícios”. Isto posto a relevância social de medidas em prol do amplo e intenso progresso cultural justifica a origem e permanência de uma legislação eficaz e adequada à realidade vigente brasileira. ”De repente, você tem duas leis, dois meios de financiamento direto para a arte no Brasil. Lei Paulo Gustavo e Aldir Blanc. É bem interessante!”, diz Juliano.
Ultrapassando o suporte financeiro, a Lei Aldir Blanc valoriza a diversidade cultural do Brasil ao destinar recursos tanto para grandes centros urbanos, quanto para municípios e pequenas comunidades. Cumprindo uma missão árdua de reconhecer previamente as especificidades de canto do país antes de agir, ela permite que artistas com distintos repertórios socioculturais tenham a mesma oportunidade de manter suas tradições vivas e sua arte ativa. Em entrevista concedida à VAN em julho, Juliano demonstrou sua torcida e preocupação a respeito de uma rápida e necessária profissionalização das secretarias de cultura para lidar com as novidades impostas pela LAB. Em sua opinião, essa tarefa desafiadora demanda paciência dos agentes culturais e estudo de carências por parte dos órgãos competentes. “Bom, sobre as leis, tanto a lei Aldir Blanc quanto a lei Paulo Gustavo, eu acho que traz uma ideia de um repasse de recursos direto para os grupos, para os artistas e fazedores da cultura em geral. Acho isso uma perspectiva bem interessante (…) Acho que essas leis estão se estruturando, acho que a gente tem um, aprendendo quais os caminhos num âmbito estadual, num âmbito municipal, aí varia de município as estruturas que precisam esses municípios ter para conseguir”, reforça.
LAB nas Vertentes
A Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB) representa uma continuidade da árdua retomada das atividades artísticas e culturais regulares em todo o país. E nesse sentido, em Minas Gerais especificamente, esta legislação é aplicada paralelamente a outros mecanismos de incentivo, como o Fundo Estadual de Cultura (FEC) e a Lei Estadual de Incentivo à Cultura (LEIC). Em suma, beneficiários e empreendedores mineiros do setor devem estar constantemente atentos às variadas possibilidades de pleitear recursos.
Após mobilização do Ministério da Cultura (MinC) para máxima adesão à PNAB, em novembro de 2023, os repasses de verba foram iniciados mediante cadastro e autorização de planos de ação elaborados por estados, municípios, Distrito Federal e consórcios intermunicipais. De acordo com o Painel de Dados da PNAB, até dezembro mais de R$181 milhões foram destinados a Minas Gerais. Para execução de iniciativas simplificadas na construção, manutenção e ampliação de espaços culturais, bem como produção, promoção e aquisição de bens culturais, ao estado mineiro foi concedido R$20.822.896,43 enquanto que para os municípios, R$160.569.732,06.
Em relação à São João del-Rei, de acordo com a Audiência Pública da Lei Aldir Blanc II realizada, a lei de crédito especial para adequação orçamentária foi lida na Câmara Municipal no dia 13 de agosto deste ano, e a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo pretendia colocar o projeto para aprovação na reunião ocorrida no dia 20 de agosto. Na ocasião, uma questão que causou grande revolta nos artistas foi a morosidade do processo que ficou por três semanas sendo analisado pela Associação dos Municípios da Microrregião dos Campos das Vertentes (AMVER). Visto que o prazo final dado para adequação orçamentária era o dia 02 de setembro de 2024 e o descumprimento deste acarreta na devolução do recurso repassado ao município, a classe artística presente solicitou esclarecimento para tantos atrasos que seguem prejudicando-os.
Juliano Pereira propôs uma reflexão sobre a pauta quando questionado sobre a execução da lei: “ (…) eu acho que a gente tem que entender, por um lado, que esse orçamento da cultura, as secretarias nunca tiveram. Então, é lógico, a gente tem um processo… Bom, a gente tem, às vezes, poucos funcionários para executar aquilo. Aí, de novo, assim, como que a gente consegue essa profissionalização das secretarias de cultura para dar conta disso, e o Brasil está pedindo isso, né? As coisas estão pedindo que as pessoas se profissionalizem porque estão vindo os recursos. Têm agora o sistema nacional de cultura, que vai transferir recursos de fundo a fundo. Como é que está o fundo da nossa cidade? Como é que vai receber recursos do fundo? Do Ministério da Cultura, então tem desafios.”
Portanto, observa-se que o impacto da LAB é significativo no panorama cultural e social não só da região, mas em todo o país. Embora o setor ainda precise de ações futuras e de políticas públicas, a lei mostrou a importância de um olhar atento e comprometido para a cultura brasileira, destacando seu papel na sociedade.