Por Danielly Faustino, Júlia Diniz e Lívia Antoniazzi

No dia 18 de novembro comemora-se o dia do Barroco Mineiro. Existem diversas formas de expressão no estilo barroco como a literatura, esculturas, pinturas e principalmente a arquitetura. Visando o conhecimento de curiosidades em outras áreas artísticas marcadas pelo barroco, buscamos reunir informações sobre a música e a moda da época e também sobre como o movimento influenciou até mesmo na linguística do país, sendo utilizado ainda nos dias atuais.

‘’O todo sem a parte não é todo, a parte sem o todo não é parte’’

– Gregório de Matos

O barroco é um estilo artístico que nasceu na Itália no final século XVI, porém surgiu na América Latina através dos missionários jesuítas, trazendo-o como uma forma de doutrinação para a fé cristã. O barroco mineiro é datado então do século XVIII até o início do século XIX e, por possuir uma região de rico comércio minerador, as igrejas são enriquecidas por camadas finas de ouro, refinamento de relevos feitos em madeira e pedra sabão em portadas e janelas. 

Entretanto, devido à distância do litoral e as dificuldades de importação de materiais e técnicas construtivas, o barroco em Minas Gerais se destaca por sua singularidade e tom regional. Segundo Ronan Couto, professor de história da arte, o barroco mineiro é a origem da arte brasileira por sua originalidade. Através da fé intimista e a relação única que os fieis mantinham com seus santos, uma forma de expressão especial foi gerada, sendo usada, inclusive, como arma da contra-reforma após o surgimento do protestantismo. 

Música barroca mineira

Entre 1710 e 1720, Minas recebeu músicos portugueses. Cerca de 50 anos depois, a região mineradora assumia o maior desenvolvimento produtivo e prático da música religiosa na América Portuguesa. Assim, o barroco mineiro esbarra com essa forma de arte e novamente cria-se um estilo original com grande carga regional. Um fator crucial para que houvesse esse destaque deu-se em 1750, quando a coroa portuguesa proibiu a importação de obras de fora da colônia. Isso fez com que houvesse um incentivo para que os compositores mineiros criassem um estilo único de música barroca, deixando sua marca séculos depois em melodias caipiras e sertanejas. Estudiosos apontam que muitos dos compositores e músicos em Minas foram mulatos e os contratos eram feitos pelas matrizes ou catedral, câmaras e entidades administrativas, irmandades ou ordens terceiras.

Em São João Del-Rei, agosto é o mês da música barroca, pois o oitavo mês do ano trouxe ao mundo, na cidade, um grande nome da música barroca são-joanense. O compositor Padre José Maria Xavier nasceu em 23 de agosto de 1819, viveu 68 anos e deixou como herança para São João del-Rei um dos mais ricos e mais importantes acervos de músicas sacras do Brasil no século XIX. São conhecidas mais de 100 obras de José Maria Xavier e o mineiro é o patrono da cadeira de número 12 da Academia Brasileira de Música.

Influência do barroco na linguística brasileira

O barroco deixou marcas inapagáveis na linguística de nosso país, ornamentando-a com rebuscamento e engenhosidade. Suas principais vertentes foram o cultismo e o conceptismo, que teciam uma tapeçaria linguística rica em figuras de linguagem, vocabulário literato e jogos de palavras.

O cultismo caracteriza-se pelo seu vocabulário rebuscado, frases longas e complexas, além de ser construído por diversas figuras de linguagem – metáforas, antíteses, hipérboles, etc. O conceptismo, por sua vez, busca a concisão e a argumentação. Com frases curtas e precisas, e um jogo de palavras e conceitos.

Nutrindo-se de matrizes africanas e indígenas, o barroco brasileiro teve palavras e temas incorporados à sua rica paleta linguística. Essa junção cultural contribuiu para a formação de uma literatura nacional com características próprias da língua portuguesa brasileira.

Influência do barroco na moda 

‘’Torna-se objeto de ação expressiva, de comunicação de mensagem, de transmissão de significados, não apenas referencial de status, mas forma de arte, forma de comunicação tornando a expressão de moda uma arte corpórea a comunicar valores.’’ […] Unem as mesmas as suas ideias, assim é concebida uma criação que para ela é única, mas que com certeza, está baseada em movimentos culturais.’’

– Glória Dal Bosco, em A influência barroca na moda através da cultura contemporânea

A referenciação brasileira de moda nesse período tinha como inspiração a moda lusitana, já que não havia outra referência de moda no país por estarem deslocados de maior contato com outros povos. A moda parisiense chegava no Brasil em terceira mão, uma vez que Portugal intermediava essa comunicação de estilos. Os adornos passaram a ser produzidos em ouro, com grandes fivelas e botões, utilizados muitas vezes pelas mulheres principalmente nos jantares femininos. Marília de Dirceu torna-se um exemplo de beleza social, que prioriza a mostra de cabelos, olhos e bustos em detrimento do corpo. Esses elementos conferem à mulher uma posição de divindade inalcançável, fragilidade e delicadeza. Além disso, nessa época sair de casa não era tão comum e as festas eram momentos nos quais as pessoas poderiam expor suas melhores vestimentas, como forma de imposição social através deste simples fator, costume que ainda permeia a sociedade brasileira contemporânea. A colorimetria das vestimentas determinava certo cunho de importância social, em que escravos vestiam majoritariamente branco e nobres, vermelho amora, rosa cravo e bege queimado. Apesar disso, com a influência das mulheres africanas sobre a indumentária brasileira, as saias rodadas e coloridas que elas usavam foram adaptadas por suas sinhás com menos cores, acompanhadas com botas, já que as africanas usualmente estavam com pés descalços. Havia também a presença de ornamentos, caso o sinhô e a sinhá permitissem, pois eram dadas pelos senhores brancos, que presenteavam as escravas mantidas como amantes.

Muitas tendências que circulavam na Europa não eram aderidas aqui pela falta de aplicabilidade devido ao clima, tal qual a presença de muitos acessórios, máscaras de maquiagem pesadas e perucas exuberantes. Aqui se era mais naturalista comparado aos padrões barrocos europeus. 

O estilista mineiro Victor Dzenk também apostou, lá em 2009, buscar referências no barroco para o desfile da coleção de verão. E retoma em 2024, com a coleção ‘’Le Palace’’.

A estamparia da marca brasileira AVE MARIA também é responsável por resgatar esse período da história como fonte de inspiração e estampa de vestuário. Uma das obras escolhidas é ‘’O Jardim das Delícias’’ de Bosch. A expressividade barroca se mostra no exagerar de sentimentos e emoções, atribuindo também uma característica lúdica. “O Jardim das Delícias”, representa bem esse contexto ao ser carregado de detalhes e de seres que integram a paisagem do quadro.

Na contemporaneidade, essa conversa entre presente e passado continua ocorrendo, sendo os estilos marcantes dos séculos anteriores uma fonte riquíssima de inspiração para os dias atuais. A artista e cantora Manu Gavassi incorpora a estética em seu álbum ‘’Gracinha’’,  com sobrecarga de informações que são refletidas na mistura de texturas e estampas, hibridismo, exagero das proporções, sobreposições, transparência e brilho. O espírito do Barroco é carregado de informações, dramaticidade e conflitos, traduzindo com excelência correspondência à atmosfera da contemporaneidade em todas as suas contradições.

Curiosidades sobre o barroco mineiro

  • As obras barrocas mineiras são consideradas um importante patrimônio cultural brasileiro, reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Mundial da Humanidade.
  • São João del-Rei ostenta um dos conjuntos barrocos mais expressivos do Brasil, ostentando o título de “Cidade Barroca” e sendo considerada um dos principais pólos culturais do estado. 
  • São João del-Rei é um verdadeiro museu a céu aberto, com mais de 20 igrejas barrocas.
  • O pintor barroco Manuel da Costa Ataíde, considerado um dos maiores nomes da pintura colonial brasileira, viveu e atuou em São João del-Rei. Outros pintores importantes do período barroco também deixaram suas marcas na cidade, como Frei Ricardo do Pilar e José de Oliveira Rosa.
  • A temática religiosa era central na decoração barroca. Imagens de santos, anjos, a Virgem Maria e Jesus Cristo eram frequentemente representadas em esculturas, pinturas e afrescos. A decoração também podia incluir símbolos religiosos, como cruzes, hóstias e cálices.
  • O único exemplar de órgão barroco europeu, vindo da Alemanha no século XVIII, está localizado na cidade de Mariana.
  • Em 26 de novembro de 2012, uma lei estadual foi sancionada declarando dia 18 de novembro como o dia do barroco mineiro.