Por Luiza Ferraz e Mariana Bessa

Foto: Reprodução – Banda de Música Theodoro de Faria
 

São João del-Rei: capital mineira das artes e cultura

A musicalidade é parte importante da cultura de São João del-Rei, marcando presença até mesmo no calendário. Dias religiosos festivos são acompanhados por dobradas especiais na linguagem dos sinos e pelo ritmo das bandas e orquestras são-joanenses. As irmandades religiosas e a música sempre andaram lado a lado na Cidade dos Sinos.

São João del-Rei atualmente possui duas orquestras, um conservatório e cinco bandas de música. As orquestras Lira Sanjoanense e Ribeiro Bastos são os grupos mais antigos, bicentenários, seguidos pela Banda Theodoro de Faria e pela Banda de Música do 11° Batalhão de Infantaria de Montanha (11° BI Mth), com 120 e 121 anos, respectivamente.

A Lira Sanjoanense e a Ribeiro Bastos preservam suas origens e as tradições do município, mantendo até hoje o repertório barroco-religioso-erudito, executado em apresentações (as ‘tocatas’) religiosas e eventuais concertos. As orquestras também fizeram parte da origem de outro patrimônio são-joanense: as bandas de música.

O surgimento da Lira e da Ribeiro Bastos está associado às necessidades das irmandades das igrejas do centro histórico de São João. A Banda do 11° BI Mth nasceu a partir da instalação do batalhão e das necessidades do regimento, já a Banda Theodoro de Faria se formou através da separação de alguns integrantes da Orquestra Ribeiro Bastos que, liderados pelo músico Augusto Theodoro de Faria, fundaram a banda.

Onde nascem os músicos

O vice-presidente da Banda Theodoro de Faria, Marcos Aurélio de Souza, conta que se encantou pelas bandas ainda criança. Como coroinha na Igreja de Nossa Senhora do Carmo, ele assistia a alvorada da Lira Sanjoanense e se maravilhava com as canções religiosas, marchas e dobrados. Nascia a paixão pela música. Marcos começou integrando o coral da Lira, onde conheceu os instrumentos musicais e permanece até hoje. Há oito anos, foi convidado para ser bombardinista na Theodoro de Faria.

Com exceção da Banda do 11° BI Mth e da Banda de Música Municipal, todas as organizações musicais de São João del-Rei oferecem vagas de musicalização, destinadas àqueles que desejam aprender do zero. O aluno escolhe o instrumento que pretende versar e, concluída a iniciação, passa a fazer parte do grupo de músicos principais.

Ao contrário das orquestras são-joanenses, as bandas de música ganharam um repertório eclético com o passar dos anos: o repertório vai do barroco ao contemporâneo, do erudito ao popular. Segundo Aurélio de Souza, essa é uma característica que chama a atenção do público e desperta o seu interesse em participar da banda, principalmente os mais jovens.

Isabella Campos, de 18 anos, é trombonista na Banda Sinfônica do Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos. Ela conta que sempre teve inclinação e aptidão para a música, desde criança. Começou o processo de musicalização na banda em 2014, com aulas de teoria musical, flauta doce e participação no coral. Isabella foi musicista da instituição até 2017, retornando em 2021, também como trombonista, e pretende seguir profissionalmente na música.

A Banda Sinfônica de Matosinhos foi fundada no dia 14 de setembro de 2008, para atender às necessidades da paróquia e do Santuário. Igor Santos, 22 anos, é percussionista e zelador da sede da Banda. Mesmo se envolvendo com a música, Igor pretende se formar em cinema. Ele conta que aprendeu sobre responsabilidade e disciplina nos anos de banda, e que os amigos músicos fazem da instituição um “cantinho”, um refúgio.

Igor e Isabella são jovens exemplos do impacto da formação musical proporcionada gratuitamente pelas bandas. Ambos comentam a importância da organização e do papel social que a banda tem hoje. “A banda de música traz vida para a cidade, é uma forma de trazer alegria para as pessoas. […] As bandas são o segundo pulmão de SJDR”, diz Igor.

 Jovem também era Tadeu Faria, quando se apaixonou pela música. O regente da Banda de Música Theodoro de Faria é filho de Theófilo Faria, um dos fundadores da centenária e tradicional banda na cidade. O músico conta que nasceu em um meio musical, uma vez que a casa de seu pai era o ponto de encontro dos ensaios. Tadeu está à frente da banda há 50 anos e foi responsável por idealizar, há quatro décadas, um dos eventos que mais conecta a música com a cidade: a Semana da Música.

Sede da Banda Theodoro de Faria, uma das mais antigas da cidade.
Foto: Mariana Bessa

A Semana da Música é organizada pela Banda Theodoro de Faria há mais de 40 anos, reunindo as bandas e orquestras são-joanenses para se apresentarem em locais como o Teatro Municipal e o Conservatório de Música. Em 2020, devido a pandemia da Covid-19, o evento não ocorreu. No entanto, em 2021, voltaram a se apresentar em grande estilo. No ano passado, as celebrações foram permitidas nos dias 11 a 20 de novembro.

Bandas em ação

O então regente da Banda Sinfônica de Matosinhos, Ronaldo de Oliveira Medeiros, diz não saber escolher qual o momento mais marcante que viveu ao lado da banda. Pensa que cometeria uma injustiça caso escolhesse um em meio a tantos marcos especiais. Entre muitos eventos em união com a Paróquia, ele relembra também os almoços promovidos pelos pais dos estudantes, bingos e rifas, que são cruciais para complementar a renda da instituição.

No que depender das tradicionais bandas de música da cidade, São João del-Rei ainda terá um futuro cada vez mais musical. O maestro crê que as orquestras e bandas são patrimônio, e pretende fazer com que a Banda Sinfônica do Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos retome a orquestra de cordas e efetue a divisão dos músicos na Banda de Concerto e a Banda Marcial. “São João del-Rei respira música, seria praticamente impossível, ver a cidade sem ouvir sua música”, acrescenta.

Banda Sinfônica do Santuário de Matosinhos.
Foto: Reprodução – Banda de Matosinhos

Tadeu, regente da Theodoro de Faria, diz que obras que possibilitam uma maior acessibilidade para os estudantes estão sendo planejadas na sede, assim como novos uniformes e instrumentos. No entanto, são aquisições que necessitam da ajuda do governo para acontecerem devido ao alto custo. O regente acredita que muitas pessoas vão até a banda procurando crescimento na carreira musical, mas o aprendizado dos alunos também é um serviço social, por isso há a necessidade de correr atrás de recursos e manter essa cultura sempre presente.

Os maestros também chamam atenção para o fato de que as bandas não sobrevivem sozinhas, e de que o envolvimento da comunidade é essencial. Ronaldo afirma que todo tipo de doação é bem-vinda, mas que o primordial ainda é o financeiro. “Não precisa ser em espécie, pode ser doação de produtos de limpeza, itens para rifa…”. Tadeu menciona também a importância de incentivar as novas gerações, para que as bandas possam formar novos músicos e novas gerações.

As bandas sanjoanenses por séculos fomentam a cultura musical por onde passam. Sua importância sendo reconhecida a cada ano, a cada nota musical e a cada pessoa que presencia o seu passar, seja como público ou como músico. Afinal, foi devido a isso que pessoas como Marcos, que nunca sonharam em serem músicos, descobriram o amor pelas bandas e seus instrumentos.