Por Cid Bruno

           Revisado por: Samantha Souza

Com a chegada da época de Natal, que começa o movimento cultural muito antes do dia 24 de dezembro, a população se prepara para as festividades. Em um país de maioria católica, como o Brasil, esta data é ainda mais arraigada. O comércio se aquece, tornando este o maior período de vendas todos os anos

Contudo, diferentes religiões têm diferentes formas de passar por esta época, onde nem todas as comemoram. Mas, na Umbanda, religião brasileira de matrizes africanas, não há consenso.

Imagem: Reprodução iStock
(Imagem: Reprodução iStock

Para Cláudio Márcio do Carmo, professor do curso de Letras da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), pai do Ilê Axé Omolocô Ti Oxossi Ogbani, no bairro Senhor dos Montes, em São João del-Rei, e que entrou para o corpo de médiuns aos 10 anos de idade, esta época significa o nascimento de de um dos maiores mentores espirituais de todos os tempos — Jesus Cristo —, e é momento de busca de boas energias e de uma espiritualização maior, com base em seus ensinamentos.

– “Nós procuramos respeitar todos os segmentos religiosos”, diz. – “Muitos filhos da casa foram católicos ou de religiões de raízes cristãs. Nesse sentido, as tradições natalinas são mantidas, porque as atividades do Ilê são descontinuadas para o devido descanso de todos.”

– “As instruções para manutenção das divindades africanas e entidades da umbanda já são passadas e conhecidas, e não entram em conflito com as comemorações natalinas”, complementa, acrescentando que as festividades na data do natal são pessoais e íntimas, sem qualquer tipo de orientação vinda dos ilês.

Jefferson Lázaro, locutor de rádio e tabaqueiro do Ilê Centro Espírita Santa Joana D’Arc, fundado por seu avô e mais dois amigos décadas atrás, fortalece nesta data o espírito de caridade. “Orientamos os filhos da casa (como também são conhecidos os ilês) a estarem se doando mais e ajudando outras pessoas”, disse, enfatizando, ainda, que nesta época do ano são muitos os pedidos de auxílio, como cestas básicas.

“Nós comemoramos o natal de forma tradicional, como todas as outras religiões”, diz. “Só que temos algumas firmezas que fazemos para os filhos de santo da casa, que é a firmeza do anjo da guarda, anualmente, sempre na semana que antecede o natal e a semana posterior”, complementa.

A fé umbandista tem heranças do catolicismo em sua construção, utilizando de sincretismos que correlacionam identidades de ambas as crenças, como Oxalá representando Jesus Cristo, mas nem todos os praticantes estão de acordo com esta conduta, como avalia Patrícia Elizabeth Pedro do Carmo, que frequenta centros desde a época de cursinhos.

Ela lamenta o preconceito existente e que, segundo ela, sempre existirá contra religiões de matrizes africanas. Mas ela reconhece não ser por maldade do público geral, mas, sim, por desconhecimento. “A ignorância é a mãe de todos os preconceitos e intolerâncias”, diz. “Para acabar com a ignorância, é necessário que as pessoas busquem conhecer, mas não através do olhar que já possuem. É se abrir para o que é diferente sem querer associar com o que já conhecem”, continua.

– “Olhar as religiões de matrizes africanas com o olhar cristão, buscando associação, é desrespeitar as práticas cristãs e as práticas afro-brasileiras. Cada prática têm seus próprios fundamentos, seus próprios credos e crenças”, continua.

Ainda assim, pelo que aprendeu com sua fé, Patrícia diz buscar estar com sua família, entes queridos e amigos, – “por ser uma data que promove a união”, finaliza.

Rodolfo Rodrigues, ator e também membro do Ilê Axé Omolocô Ti Oxossi Ogbani, partilha um pouco da opinião de Patrícia. Para ele – “viver a matriz africana, para entendê-la de fato, nas palavras do meu pai de santo, requer esse processo de descolonização”, diz. – “Por que, na ótica da colonização, sempre vamos interpretar a matriz africana com uma ótica de julgamento”, continua.

Ele acrescenta que em dezembro, no seu ilê, se realiza a festa Oxaguiã e Oxalufã, entidades que algumas casas sincretizam como o Senhor do Bonfim, mas Oxalá não é Jesus. – “Cristo foi um profeta ao qual acreditamos, mas não seguimos a doutrina religiosa que surgiu a partir dele: o cristianismo.”

Para Rodolfo, é importante lembrar que o natal é uma festa pagã, em que se louvava os deuses nórdicos, de onde surgiu a cultura de utilizar pinheiros com ornamentos. – “No entanto, o ato de se reunir nessa época do ano, se tornou uma cultura comum, e o natal transcende essa interpretação de comemorar a vinda do menino Jesus, para o bem. É época de solidariedade e reflexão, e, para o mal, comercialização e fartura em meio à pobreza”, finaliza, criticando o tom mercantil que a data tomou.