Refletindo sobre mais um três de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa

Por Clarice Muscalu

Toda vez que ouço a palavra “imprensa”, lembro-me sempre das palavras de Jurandir Ferreira, numa crônica publicada em 1964 (note a atemporalidade e o ano de publicação): “Mas a imprensa, como o cinema, pode-se argumentar, deu em indústria”. E, realmente, é isso: a imprensa virou negócio.

Como uma criança presa às saias da mãe, a imprensa hoje se consolida atada ao capital e suas muitas propriedades. E, é claro que ela assim se constituiria. Vivemos em uma sociedade capitalista, sob governança, acima de tudo, do dinheiro. Portanto, lidemos com as circunstâncias. Mas, isso não exclui, muito menos desvalida, o potencial jornalístico tão necessário para a conservação de um outro lado da imprensa, daquele tão mais importante e significativo para a construção de humanidade. Daquele lado que pouco se baseia no capital e, sim, no aspecto mais puro e genuíno do jornalismo. Um lado mais humano, mais sensível. 

Por isso, falar sobre liberdade de imprensa me parece uma importante tarefa. Entretanto, complicada. Primeiramente, porque ela está diretamente ligada ao direito constitucional de acesso à informação e tem papel fundamental na vivência comunitária. Porém, num segundo plano, é necessário lembrar que existe esse lado da imprensa completamente imerso nas raízes mais profundas do capitalismo, o que retira, em grande parte, o compromisso (necessário) do jornalismo com a sociedade. O que retira do jornalismo sua parte mais importante: a possibilidade de estimular uma sociedade com consciência de si mesma e de suas circunstâncias.

Portanto, eu questiono: liberdade de imprensa até que ponto? Seria estimular uma imprensa livre divulgar o lado mais chulo e desprezível do jornalismo? Ou até mesmo a propagação das tão temidas fake news? Isso porque não estamos falando de um âmbito regional – nesse lugar – o buraco é mais fundo. Por isso, penso que a liberdade de imprensa precisa, mais do que tudo, estar vinculada à noção de uma comunicação contra-hegemônica e que saiba navegar pelas narrativas. São, a meu ver, concepções indissociáveis e que permitem uma estrutura social que pulsa pelos princípios de civilidade, senso de decência, sensibilidade e, de fato, liberdade. 

Termino como comecei: lembrando de Jurandir Ferreira*. “O jornal, por modesto que seja, é uma bandeira de cidadania, um símbolo de aspiração coletiva, um gesto de engajamento nas fileiras da atualidade, um triunfo sobre o ramerrão, a rotina, a marcha da ré”. Talvez, assim, entenderemos verdadeiramente sobre liberdade de imprensa.

*Jurandir Ferreira era Farmacêutico e foi contista, cronista e romancista, além de crítico literário. Nasceu em Poços de Caldas (MG), em 2 de setembro de 1905. Faleceu na mesma cidade, em 14 de dezembro de 1997.