Por Igor Chaves

“Democracia direta e participativa”. É assim que o jornalista Rafael Oliveira Santos define a Gabiroba, empreendimento econômico solidário do qual é fundador, ao lado da comunicadora Beatriz Costa Larizzatti e do arquiteto Antônio Martins. Criado em 2023, o grupo presta serviços de comunicação para seus iguais: demais empreendimentos solidários, movimentos sociais e organizações comprometidas com a transformação social. 

Equipe da Gabiroba junto do Fórum Regional de Economia Solidária em plenária realizada em 2023. Foto: Reprodução/Gabiroba Comunicação

A Gabiroba tem sua base num modelo horizontal de gestão, com raízes no cooperativismo, “sem patrão”, como explica Rafael. Os associados dividem as demandas coletivamente, de acordo com sua capacitação, e também os resultados do trabalho. “A gente tem dentro do grupo designer,  jornalista, fotógrafo, filmmaker […] vemos os serviços que vão ser necessários e fazemos uma divisão interna dessas tarefas, que também resulta na divisão do valor que a gente vai receber. Quem trabalha mais recebe mais, quem trabalha menos recebe menos, tudo proporcionalmente”. 

Maria Conceição “Tutuca”, liderança histórica do movimento da economia popular solidária no Campo das Vertentes e atual Agente Territorial de EPS no Programa Paul Singer, define essa alternativa econômica como um “outro mundo possível”, onde o protagonista é o povo, e não o dinheiro. Em entrevista para o documentário “São João do Bem Viver – A História da Economia Popular Solidária na Cidade que Resiste”, produzido pela Gabiroba, ela explica: “(A EPS) É um modelo diferente de produzir, comercializar . É o direito de escolher como se quer viver”. 

Contudo, assim como qualquer outro empreendimento, a Gabiroba também encontra dificuldades no mercado atual. Rafael conta que nem sempre as relações intrapessoais dentro do cooperativismo ficam bem definidas: “é normal as pessoas serem um pouco mais autoritárias, mais centralizadoras, e a gente tem que trabalhar com isso, para lembrar que ninguém ali é chefe de ninguém, que as coisas são coletivas”. 

Fazer a gestão financeira também não é fácil. A maioria dos clientes da empresa são entidades, ONGs, movimentos sociais, sindicatos, partidos políticos de esquerda que estão “no lado de cá da luta de classes, no lado dos operários, que nem sempre têm os recursos,  os acessos, os meios, os equipamentos”. Essa realidade impõe o desafio de conseguir fazer um orçamento que seja justo para quem está trabalhando, mas que também se mantenha dentro da realidade financeira desses parceiros. O grupo segue como princípio “as convenções trabalhistas da área” e as “tabelas de preço que os sindicatos e associações da comunicação, do audiovisual, do design e do jornalismo definem como remuneração justa”. No entanto, como ele reconhece, é difícil “fazer um orçamento que tenha esse preço justo para os trabalhadores, mas que também caiba na realidade financeira dos nossos clientes”.

Cena do documentário São João do Bem Viver Foto: Reprodução/ Gabiroba Comunicação

Rafael aponta que a comunicação nem sempre é acessível a todos, e ter uma agência direcionada à economia popular é também fortalecer os movimentos sociais. “A gente vê que a comunicação é uma parte importante da luta política, para a gente propagar as nossas ideias, denunciar o que deve ser denunciado. Então, acho que, dessa forma, a Gabiroba se fortaleceu, e a gente vê que ter agências desse tipo, especializadas nesse tipo de conteúdo, dessa comunicação de causas, fortalece as próprias lutas e pautas desses movimentos”.

São João do Bem Viver

Como já apresenta, Maria Conceição “Tutuca” é uma das personagens do documentário “São João do Bem Viver”, uma produção da Gabiroba Comunicação Solidária por meio da Lei Paulo Gustavo de incentivo à cultura. O filme registra as histórias, memórias e lutas da Economia Popular Solidária na cidade dos sinos. O filme teve estreia no dia 01 de setembro de 2025 e desde então tem circulado em eventos, encontros e mostras ao redor do Campo das Vertentes, além de estar disponível no canal oficial da Gabiroba no YouTube.

Maria Conceição “Tutuca” para o documentário São João do Bem Viver. Foto: Reprodução/Gabiroba Comunicação

Rafael compartilha que o documentário surgiu da ideia de “contar a história do Fórum Municipal de Economia Solidária”, compreendendo “quando o fórum surgiu, por que surgiu, qual era o contexto político da época e qual foi o resultado dessa articulação nos empreendimentos”. Para construir esse registro histórico, a equipe da Gabiroba pesquisou militantes históricos do movimento. As principais vozes ouvidas foram, além da Tutuca, o professor aposentado da Universidade Federal de São João del-Rei, Benedito Anselmo “Bené”.  Juntos, eles narram o surgimento do fórum e a solidificação do movimento desde o final dos anos 90. O documentário também acompanha três empreendimentos locais: a Associação de Agricultura Familiar (AAFAS); o Grupo Jandiras, coletivo de costura; e a Associação de Bairro do Senhor dos Montes, que tem feira e horta comunitária, retratando o cotidiano e a diversidade das iniciativas de economia solidária na cidade.

Para Rafael, realizar o documentário é “uma prova viva do que a gente queria com a Gabiroba, que é dar voz para os movimentos”. Ele aponta a desigualdade de acesso à mídia, observando que “os grupos e empresas da classe burguesa têm seu espaço nos jornais e nas rádios, enquanto as articulações da classe trabalhadora não têm recursos nem equipamentos”. Por isso, o coletivo busca fortalecer causas que se alinham aos seus princípios: “a economia solidária, a comunicação popular, o anticapitalismo e a luta contra todas as formas de opressão”.