Diálogos dos Saberes: Coletiva Seletiva chama atenção para organização da economia
Por Igor Chaves
A coleta seletiva começou em São João del-Rei nesta última segunda-feira, 1º de setembro. Após anos em debate no município, a gestão do prefeito Aurélio Suenes (PL) implementou a iniciativa, que tem como principal objetivo a recolha de materiais recicláveis, previamente separados durante o descarte de lixo.
Para garantir a execução do serviço, a administração municipal adquiriu dois novos caminhões e conta com o apoio da Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de São João del-Rei (ASCAS). A coleta seletiva funciona em rotas que se alternam de segunda à sexta-feira entre as regiões do município, e ainda oferta uma rota diária no centro comercial da cidade.
Agora, para o secretário municipal de meio ambiente, Fábio da Silva, a busca é para que a mudança aconteça “nas pessoas em casa, no trabalho, nos locais onde as pessoas estão produzindo resíduos, [já que] elas vão separar esse material”. Para ele, agora com os caminhões já rodando a cidade, o próximo passo é “convencer as pessoas da importância de separar na sua casa, na empresa, no comércio, aqueles materiais que podem ser destinados para reciclagem”.

SEPARAR PARA TRANSFORMAR
O lixo em São João del-Rei é um problema antigo. A Vertentes Agência de Notícias acompanha a pauta desde 2011, e ainda em junho deste ano, denunciou o acúmulo e descarte inadequado de resíduos na cidade. As dificuldades vão desde a falta de lixeiras nas ruas até a existência de um aterro controlado, não regulamentado, para onde o lixo é levado. Neste caso, a implementação da coleta seletiva não extingue o modelo de drenagem, mas reduz a quantidade do que é descartado irregularmente.
O material recolhido pela coleta vai para a ASCAS. Desde 2003, a instituição trabalha na separação de materiais para a reciclagem. O valor do que é vendido volta em forma de sustento para os quinze catadores credenciados. A presidente da associação, Zulema Dias, destaca que, com a coleta seletiva, o trabalho aumentou expressivamente na associação: “a partir do dia primeiro começou a bombar […] o caminhão chega e despeja, estamos recebendo bastante material, entraram mais catadores”.

O secretário de meio ambiente reforça que o incentivo à ASCAS era uma das apostas iniciais: “vamos aumentar o número de material que a ASCAS vai receber e, com isso, os trabalhadores da instituição vão ganhar um recurso ainda melhor”. E tanto Fábio quanto Zulmea concordam que o foco agora deve recair sobre a conscientização da população. “Ainda estamos recebendo bastante comida, seringa, fralda, mas bastante material bom também”, aponta a presidente da associação, e continua: “agora, é conscientizar a população a saber separar”.
ECONOMIA POPULAR, CIRCULAR E SOLIDÁRIA
Os catadores da ASCAS vivem integralmente do material vendido para reciclagem. “Tiram todo o sustento, compra as coisas que precisa, paga aluguel, conta de luz e água, tudo a gente tira aqui”, conta Zulmea. Essa organização do trabalho em forma de cooperativa integra o conceito da chamada economia solidária, que busca assegurar a subsistência e aperfeiçoamento das condições de vida daqueles que nela trabalham.
Para o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada* (Ipea), por mais que a realidade dos catadores seja heterogênea em de maquinários e infraestrutura física, as “organizações de pessoas” tendem a contribuir significativamente na criação de postos de trabalho, melhora na qualidade de vida e na preservação do meio ambiente.

Nesse contexto, a sustentabilidade também ganha vez. O secretário de meio ambiente de São João del-Rei, Fábio da Silva, acredita que a coleta seletiva é também um espaço para refletir sobre o consumo: “a coleta seletiva vem trazer essa grande contribuição para a nossa sociedade. Também, nós podemos ser consumidores mais conscientes. Dessa forma, vamos também contribuir com o meio ambiente mais equilibrado”.
O consumo sustentável adentra um segundo conceito de economia, o da economia circular, alternativa ao atual modelo linear de produção que não prevê o retorno saudável dos materiais para o ciclo econômico ou para a natureza. Todos esses modelos de produção somados são entendidos como inseparáveis de outras dimensões estruturais, como a justiça social, a cultura e a segurança alimentar e nutricional.
*Informações retiradas do capítulo cinco, Reciclagem e economia solidária: análise das dimensões estruturais dos empreendimentos coletivos de catadores no Brasil, escrito por Sandro Pereira Silva e disponível no livro Dinâmicas da economia solidária no Brasil: organizações econômicas, representações sociais e políticas públicas, publicado em 2020 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).