Por Ana Luíza Fagundes e Lara Reis

Telão montado na rodoviária velha.
Cine no Ponto ocupa a Rodoviária Velha com cultura. Foto: Reprodução/Cinema na Rua

Enquanto as salas de cinema encontram-se preenchidas por um número infinito de obras hollywoodianas, o Coletivo Cinema na Rua tem trazido a magia das telas para as ruas de São João del-Rei. Fundado por Pedro Garbo e Ana Lua em dezembro de 2023, o coletivo realiza sessões gratuitas na cidade e joga holofotes sobre a produção latino-americana. Assim, a sétima arte ganha caráter democrático e espaços para trocas culturais vão sendo criados.

Nas palavras de Ana Lua, o objetivo do Cinema na Rua é criar um ambiente de discussão e conforto. “Assistir a um filme é algo que impacta todo mundo que está ali, cada um traz uma perspectiva e isso traz um elo e um diálogo muito bom. O intuito é estar na rua para mostrar o que a gente está conhecendo e despertar interesse nas pessoas. (…) É trazer filmes que ninguém está assistindo, seja na televisão ou na sala de cinema”, comenta.

Complementando, Pedro Garbo diz que, desde o princípio, o movimento procurou ampliar o acesso ao universo cinematográfico. “A gente sempre teve a ideia de não fechar esse cine clube num espaço particular, porque isso dificulta o acesso. Mesmo que seja de graça, nem todo vai entrar na galeria de arte, então estar na rua é um jeito de ampliar esse acesso”.

Recentemente, o Cinema na Rua realizou a mostra “A Palestina”, uma série de exibições que ocupou as cidades de São João del-Rei, Resende Costa e Tiradentes durante o mês de junho. Acreditando no poder do cinema como uma ferramenta para estimular a reflexão crítica, o coletivo buscou combater a desinformação e sensibilizar o público sobre a causa palestina.

Moradores na rodoviária velha assistindo filme.
Moradores são-joanenses assistem a sessões no Cine no Ponto. Foto: Reprodução/Cinema na Rua

A democratização do cinema nas ruas são-joanenses é um dos pontos principais do projeto que, segundo os idealizadores, vem sendo alcançado. “Aos poucos, o coletivo vem sendo conhecido tanto pela população, quanto pelas instituições, que têm cada vez mais dado espaço e apoio, estamos expandindo até para fora da cidade.” Comentou Garbo que, junto com Ana Lua, relembrou a primeira exibição na Rodoviária Velha da cidade, sendo a única transmissão fixa até hoje, que acontece na primeira quarta-feira de todo mês, intitulado de “Cine Ponto”. 

Refletindo e se aprofundando nessas memórias, os trabalhadores , estudantes da arte e cultura destacaram a importância da curadoria das mostras exibidas e a fluidez da pós-exposição. “A curadoria é muito importante, normalmente não divulgamos o nome do filme, e a naturalidade de alguém estar passando para comprar um lanche ou ir a casa de um conhecido, e parar para assistir o que está sendo exibido, e aquilo impactar na rotina daquela pessoa, isso é o importante. (…) Não significa que todas as vezes que o projeto acontece vai ter roda de conversa, vai das pessoas, não ficamos presos a isso.” 

Ana e Pedro, com o decorrer do tempo e com o crescimento da discussão da Lei Paulo Gustavo, perceberam que o movimento do Cine Clube  já existia na pequena cidade histórica. Todavia era feito exclusivamente em espaços fechados, e foi interessante ver a assimetria entre eles, principalmente quando começaram a chegar propostas de instituições para atuarem juntos, possibilitando que o clube crescesse em outras áreas.

A importância da sétima arte

Fundadores do Cinema na Rua.
Pedro Garbo e Ana Lua. Foto: Reprodução/Cinema na Rua

Para Pedro Garbo, a sétima arte desempenha um papel fundamental na construção da identidade de um povo e na formação de ideologias. Segundo ele, o cinema é uma forma de representação e auto representação, “Sem o cinema a gente fica um pouco órfão dessas apresentações que podem trazer pra gente essa leitura sobre quem somos nós, sobre como nós nos vemos”.

Ele também destaca a relevância do cinema independente nesse processo. “O cinema mais independente é importante pra gente conseguir visualizar melhor qual é o nosso lugar, nesse espaço cultural”, complementa.

Ana também ressalta a importância do cinema como um momento de reflexão e impacto, onde o espectador pode mergulhar em imagens e sair do filme com pensamentos que o acompanharão por muito tempo. “Eu acho que o cinema em si pode ser muito forte, porque é um momento que você está em silêncio, vendo imagens e ouvindo sons durante duas, três horas”.

Contudo, ela ressalta que, muitas vezes, a influência das salas de cinema e da televisão impede o cinema de exercer todo o seu potencial. “Eu acho que a importância do cinema hoje é um pouco mais fraca e mais manipulada do que deveria ser, do que pode ser. Hoje em dia, a gente tem as redes sociais e a televisão e é tudo tão despedaçado. As vezes é só um entretenimento para manter a gente seguindo uma ordem.”

Os produtores ainda apontam para o monopólio da produção e distribuição de filmes. Como dito por eles, essas etapas demandam altos investimentos e, por isso, são dominadas por poucos grupos econômicos, que detêm salas de cinema nos centros urbanos e relações com grandes produtoras internacionais. Nas palavras deles, essa concentração dificulta a entrada de novos cineastas e a diversidade de produções nacionais.

Ainda assim, apesar de evidenciarem os desafios enfrentados pela sétima arte na atualidade, ambos enxergam o cenário cinematográfico com otimismo. Afinal, novos movimentos de artistas têm se levantado para debater sobre o cinema e produzir arte.

Assim, proporcionando debates e momentos de lazer e reflexão, o Cinema na Rua vem colorindo as ruas de São João del-Rei e jogando holofotes sobre as dificuldades e alegrias do universo cinematográfico.

Serviço

Acompanhe o projeto no Instagram: @cinema_narua