Por Ana Julia Barbosa, Livia Fernandes e Rafaela Andrade

Este ensaio fotográfico surge como um convite à memória, à lembrança e à preservação de fatos. Lélia Gonzalez trata em muitas de suas obras a descolonização do pensamento como peça-chave para a conscientização e discussão de questões raciais. Analisando nosso país de forma inovadora, a pesquisadora elaborou conceitos que refletem uma consciência dominante brutal e perigosa.

Esquecer traços do passado escravocrata e da presença africana aqui foi algo bem articulado e desenvolvido em cidades, como São João del-Rei. Entre as consequências, aspectos culturais negros são ainda desvalorizados e “invisíveis” em nosso cotidiano atual.

Uma sequência de registros feitos por localidades da “cidade dos sinos” busca agora relembrar e redescobrir hábitos, costumes, crenças e ideologias de um Brasil não tão distante do de hoje. Confira os cliques!

Cicatriz

Fotografado na Praça Barão de Itambé, em São João del-Rei, no dia 23 de maio de 2025 , o pelourinho de pedra marca um lugar de memória e violência.

No passado, estruturas como essa eram usadas para castigar publicamente pessoas escravizadas, símbolos do poder e da repressão nas vilas coloniais. Este monumento, construído no início do século XIX, substituiu outro, feito de madeira, que ficava no Morro da Forca. Apesar de hoje parecer apenas uma escultura antiga, sua permanência na paisagem urbana nos obriga a lembrar do que muitos tentam apagar: a brutalidade da escravidão e os corpos negros que sustentaram essa história.

Segregação nas igrejas

Foto: Ana Julia Barbosa

Foto tirada no interior da Matriz de Santo Antônio em Tiradentes, no dia 24 de maio de 2025. O enquadramento mostra o coro alto, espaço onde os negros eram segregados durante as missas nas igrejas da elite. Este local, distante do altar e da nave central, simboliza a tentativa de manter a presença negra invisível. Mas essa imagem nos convida a lembrar que, mesmo à margem, a memória resiste e observa, de cima.

Onde a fé também era luta

Fotografada no dia 23 de maio de 2025, em São João del-Rei, esta igreja foi construída para as pessoas negras escravizadas. Em contraste com os templos luxuosos destinados às elites brancas, este espaço de fé é também um símbolo de resistência. A própria construção, feita por mãos negras, carrega memórias que resistem ao esquecimento imposto pela consciência dominante.

Ritmo de resistência

Foto: Rafaela Andrade

Foto tirada em Tiradentes no dia 24 de maio de 2025. A pintura retrata um grupo de congado, tradição afro-brasileira que mistura fé, música e resistência. Mesmo com o apagamento cultural imposto pela consciência dominante, as manifestações como o congado seguem como forma viva de memória, transmitida entre gerações. A imagem mostra como a memória negra fala alto nas ruas da cidade, mesmo quando não é oficialmente celebrada.

Voltar para não esquecer

Foto registrada em São João del-Rei no dia 23 de maio de 2025 , revela Sankofas presente na arquitetura, uma imagem originária da cultura Akan, que representa a ideia de “retornar ao passado para ressignificar o presente”.

Discreto, quase invisível aos olhos distraídos, esse detalhe é um sinal da memória que sobrevive à tentativa de apagamento histórico. Ao contrário da consciência dominante que exclui, o símbolo Sankofa nos lembra que o passado negro é parte fundamental da construção do agora.