Pelos trilhos de São João del – Rei, pegamos o trem da boemia e
paramos no bar mais frequentado da cidade, para nos encontrar com nosso
entrevistado.
Se colocar no mundo através da palavra é o que tem buscado Igor Alves,
pesquisador sobre espaços de enunciação da poesia contemporânea. Em uma mesa de
bar, entre goles de cerveja e os burburinhos de conversas alcoolizadas, o poeta
conta sobre sua trajetória por linguagens, palavras e poesia. Suas influências
e a relação com o que chama de “prática da noite”, temática do seu novo título
“Tudo que é sólido desmancha no bar” também foram assunto de nossa conversa.
Nascido em Lavras, ele conta que, desde pequeno, manifestava
interesse por poesia, leitura e escrita. Filho de professora de escola pública,
Igor deparava-se em casa e na escola com nomes como Vinícius de Moraes, Álvares
de Azevedo e Paulo Leminski. No primeiro ano do ensino médio, já tomava coragem
de recitar poemas para colegas de escola e declamava, às vezes acompanhado por
amigos que até hoje estão junto com ele, como o músico Lucas Batista. Ele fez
graduação em Letras, tendo entrado na Universidade Federal de São João del-Rei
com 17 anos.
A esta altura da conversa, Igor já estava revirando uns goles de whisky.
Sem deixar o copo de cerveja de lado, relembrava uns versos de Chacal: “Imagine
se um dia a música parasse de tocar e o começasse a ser consumida apenas
através da partitura. O mundo iria ficar mais triste.” Poeta e parceiro de
Igor, Chacal, desde a época da poesia marginal, busca resgatar a poesia
(principalmente a falada) em nossas vidas. O acinzentamento da sociedade, que
confundiu a escrita fria com a poesia, é o que incita Igor Alves a algumas de
suas práticas. Inspirado na trajetória de Chacal, ele tenta trazer a poesia de
volta à vida, semeando livros nos bares por onde passa e recitando versos aos
quatro ventos.
Respirar, tomar
uma cerveja e escrever um poema
“Escrever é a mesma coisa que respirar, trabalhar, estudar,
transar, tomar uma cerveja. É coisa séria. E inevitável”, afirma Igor ao
refletir sobre os afazeres poéticos. Suas produções já renderam dois livros, sendo
o primeiro “5.000 sentidos: Ontologia Poética”, lançado com um recital na
Orquestra Popular Livre, em 2011. Já o segundo livro, “Tudo
que é sólido desmancha no Bar”, foi lançado no
Inverno Cultural desse ano, evento em que o poeta também participou ministrando
uma palestra e um minicurso. Ambos os livretos foram feitos de forma
independente e podem ser encontrados para venda nesse mesmo bar em que nos
encontramos. Todas as edições feitas para o lançamento em julho já se
esgotaram. Sobre as editoras, Igor afirma não se preocupar com elas por ora, já
que “hoje em dia é muito fácil, você edita, imprime e vende”.
É tudo feito de maneira muito simples, e esta é a intenção, sem
aquela roupagem chique, como ele mesmo relata. Tirar a gala do poema é o
propósito. A poesia é paixão declarada à língua, e nada como democratizar esta
serenata linguística. Parafraseando Leminski, ele cita: “a poesia é a paixão da
linguagem e a linguagem da paixão”. Os bares influenciaram o título, pois,
conforme acredita Igor, neles a obra encontra seu fim: ser consumida, vulgo
democratizada.
Igor Alves admite: poesia não é “uma coisa que escolhi fazer. É
uma coisa que veio, como um vício”. Algumas de suas poesias podem ser
conferidas em:
Vida
Curricular
Ter
estudo
ter
extrato
ter
status
arrecadar
fundos
ajudar a
destruir o mundo
Assim como o
próximo
amar a si mesmo
esperar a morte
passar
pra vida chegar
Ah sim
seja seja seja
o man
amem e comprem
amém!
Se produzir
reproduzir
em nome do
padrão
em nome do
patrão
nunca dizer não
O mercado te
espera
mantenha as
cartas
marcadas
na manga
Você tem o
direito
de ficar calado
qualquer
problema
chame o advogado
Cruz Crédito
Outros:
vodka
montanha
roleta
( . . . )
a vida é russa
.
Hai Tec
LP CD DVD HD
cada vez mais
memória
e menos pra
dizer
.
A cracolândia é
o mundo
quem aos vícios
se nega
que acenda

a primeira pedra


VAN/Marlon de Paula e Mariana Chaves
Foto: Marlon de Paula

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