A história de São João del-Rei é contada pelos sinos
Por Oswaldo C. Almeida
Os sinos da Igreja Nossa Senhora do Carmo acompanham São João del-Rei ao longo do dia, graças à cultura secular de sineiros. Geração por geração, há cerca de 291 anos, eles contam pelo toque onde, quando e quem irá celebrar a solenidade, além de eventos e falecimentos, servindo como um guia dos são-joanenses.
Nossa Senhora do Carmo, fundada em 1732, é uma das igrejas centenárias que foram catalogadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Os moradores próximos contam que é bom ouvir a melodia dos sinos, já que eles se comunicam com a população ao avisar o que está por vir.
Nada disso seria possível sem os sineiros, treinados para reproduzir as melodias e os repiques. Patrick Anderson, um dos veteranos responsáveis pelos sinos e excursões, conta um pouco mais sobre a cultura dos sinos em São João del-Rei na entrevista concedida à equipe de reportagem da VAN. Confira!
VAN: Quando começou a tradição dos sinos aqui em São João?
Patrick: A tradição não tem um período certo de onde começou e nem tem uma história conclusiva de como. Até então nosso sino mais antigo é de aproximadamente 1773 e com ele, segundo a história, começaram a elaborar os toques. A teoria mais falada que tem, e que é inclusive falada no “Museus dos Sinos”, é que foi através dos escravos, pois o senhor não iria subir na torre para tocar e mandava eles fazer esse trabalho. Como tinham conhecimento apenas das melodias das culturas africanas, derivados da umbanda, candomblé, o badalar ganhou essa forma e timbre semelhante aos toques que permanecem até hoje.
Inclusive, imagino que os novos sineiros apenas reproduzem. Não sabem de onde vem esses toques que vem evoluindo com o tempo.
VAN: Como essa tradição se tornou tão importante para São João Del-rei ser conhecida como “ Terra onde os sinos falam”?
Patrick: Aqui tem muitas regras para os sinos, não se pode tocar sino fora do horário. Tanto que quando isso acontece, a população estranha e busca saber o motivo. Os motivos são vários, desde um falecimento, enterro ou missa. Todos com seu toque próprio, dia próprio e horário próprio.
Por exemplo, no Domingo sempre tem um toque, chamado “Dia de Missa”. A “Chamadinha de Padre”: temos que falar com o padre que vai realizar a cerimônia, pois se é um, toca três vezes no final, se é outro, quatro… Incluindo, tem um toque guardado para caso o Papa venha.
O sino virou tipo uma forma de identificação. Uma melodia da cidade.
VAN: Então virou como uma rádio notícia do clero para a população?
Patrick: Sim. Imagina algo desse tamanho, no centro da cidade, por exemplo, apenas balançando. As pessoas perguntam, buscam saber o que houve.
VAN: Os sinos antigos, quando se quebram, vão para o Museu?
Patrick: Antigamente, por volta de 2005, não tinha essa cultura de preservar, então quando um deles rachou, infelizmente descartamos.
Com o Museu de Sinos, um projeto do André Dangelo, autor do livro “Sentinelas Sonoras”, agora o procedimento é trazer para cá quando algo se quebra. Algo raro, só aconteceu três vezes em São João del-Rei.