Não há como falar de racismo ambiental sem tratar do racismo estrutural
Texto de: Celine Almeida, Giovanna Fuccio, Gustavo Lage, Hanna Alvarenga, Isadora Jales, João Gabriel, Jordana Nery, Larissa Lima, Laura Pereira, Rafael Oliveira, Vitória Cristina
Revisado por: Samantha Souza
Entre os dias 6 e 18 de novembro, o mundo voltou sua atenção para o Egito, que sediou a 27ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-27), o maior e mais importante evento já realizado sobre o tema das mudanças climáticas. O Brasil esteve presente em três espaços durante a COP-27: o Brazil Climate Action Hub, organizado pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e o Instituto ClimaInfo, assim como o Consórcio Amazônia Legal e o do Governo Federal.
Visando conter as mudanças climáticas e seus efeitos a partir de mecanismos aplicáveis globalmente, dezenas de líderes mundiais se encontram para reuniões e debates a fim de estabelecer pactuações viáveis e negociar como financiar medidas de adaptação e mitigação dos danos dos eventos climáticos que são cada vez mais frequentes. Um dos temas discutidos no evento foi o racismo ambiental, pautado pela Coalizão Negra Por Direitos e enriquecido pela presença do coletivo Criola, que representa organizações do terceiro setor e também esteve presente nas discussões sobre justiça climática e vivências negras.
Entre as pautas abordadas na COP-27, tornou-se possível entender as raízes do racismo estrutural, com o objetivo de amplificar a urgência de se tratar do assunto, uma vez que afeta diretamente povos e territórios periféricos. Afinal, o legado racista é decisório para a crise ecológica global. Alegretti et al (2013) trazem em sua obra discussões sobre o tema, e destacam a crise ecológica como um desafio para a democracia. Em suas citações, abordam Martinez-Alier (2002) e Harvey (1996) quando dizem como o ambiente é o terreno em que diferentes problemáticas ligadas à justiça socioespacial podem manifestar-se. Isso porque as mudanças climáticas atingem de maneira desigual grupos sistematicamente marginalizados, como a população negra, quilombola e indígena.
Para corroborar, Schnaiberg (1980) apresenta os recursos do planeta como distribuídos de maneira desequilibrada. Para o autor, trata-se de injustiças de tipo distributivo, ligadas às formas como os custos do desenvolvimento recaem sobre coletividades, na maioria das vezes, naquelas que são objeto de discriminação por várias razões. Ainda, ele ressalta como os benefícios do ecossistema são privatizados e voltados para aqueles com melhor situação financeira. Nesse cenário, torna-se necessário falar sobre racismo ambiental em conjunto com o estrutural, uma vez que ambas as expressões andam juntas, posto que o racismo ambiental define a ação institucionalizada, fundada no racismo estrutural.
Nesse sentido, o termo racismo ambiental foi cunhado pelo ativista afro-americano Benjamin Chavis e se refere à estratificação da população na comunidade e no território a partir da raça, cor, etnia e gênero. Na prática, é que, grupos étnico-raciais em situação de vulnerabilidade são diariamente negligenciados em relação à saúde, moradia e saneamento básico, impactados diretamente em riscos ambientais e, quando ocorrem eventos climáticos extremos ou crimes ambientais, estes grupos são, por consequência, os mais afetados.
Segundo Dulce Maria Pereira, professora da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), a concepção também pode ser entendida como “o exercício do poder por meio da retirada de direitos de grupos humanos nos territórios que ocupam”. Ou seja, essas “comunidades são vulnerabilizadas, deslocadas, expulsas, submetidas a condições insalubres”. Em sua coluna para o Congresso em Foco, a autora ressalta o quanto esses conceitos vão ao encontro um do outro, tendo em vista que todos os “desastres ecológicos” possuem procedência e poderiam ser evitados, como destaca Robert Bullard, precursor do conceito de justiça ambiental. Ou seja, não é por coincidência que a maioria das vítimas desses acontecimentos sejam grupos socialmente marginalizados e racializados.
Por isso, as considerações sobre racismo ambiental com intuito de trazer melhores práticas é uma demanda levada ao Egito pelo movimento negro, com uma série de reivindicações na agenda. Afinal, o racismo ambiental faz ainda com que as pessoas das periferias, onde no Brasil está a maior parte da população negra, estejam entre as que mais sofrem os impactos negativos das mudanças climáticas. Pensando nisso, Amanda Costa, ativista climática, fundadora do Perifa Sustentável e jovem embaixadora da ONU (Organização das Nações Unidas), participa da
COP-27 para amplificar o tema e mudar esse cenário. Isso porque não há como falar de justiça ambiental sem tratar da justiça racial. Portanto, eventos como a COP-27 se fazem necessários para trazer o tema à tona, de modo a proporcionar avanços no debate a fim de se firmar como uma pauta indispensável e cada vez mais imprescindível, com planejamentos e ações efetivas voltadas para resoluções das questões.